Nomeação à autoria
Prevê o art. 62 do CPC que “aquele que detiver a coisa em nome alheio, sendo-lhe demandada em nome próprio, deverá nomear à autoria o proprietário ou o possuidor”.
Referido dispositivo prevê o instituto da nomeação à autoria, espécie de intervenção de terceiros “por meio da qual o detentor da coisa demandada, erroneamente citado para a causa, indica o verdadeiro proprietário ou possuidor, a fim de que o autor contra ele dirija a ação”, conforme conceituação de Ovídio Araújo Baptista da Silva.
O principal objetivo pretendido com a nomeação à autoria, segundo aponta Ernani Fidélis dos Santos, é corrigir a composição do pólo passivo da demanda:
A finalidade da nomeação à autoria é apenas a de se fazer o acertamento da legitimidade ad causam passiva no processo. Não há sanção direta para a não-nomeação. Se o réu estiver em relação de dependência com outra pessoa e for demandado, sem nomeá-lo à autoria, nem por isso se tornará parte legítima e o autor poderá ser julgado carecedor da ação.
A segunda hipótese em que é cabível a nomeação à autoria vem expressa no art. 63 do CPC, segundo o qual, no caso de uma ação de indenização intentada pelo proprietário ou pelo titular de um direito sobre a coisa, se o responsável pelos prejuízos alegar que praticou o ato por ordem ou em cumprimento de instruções de terceiro, a nomeação à autoria deve ser dirigida ao mandante.
Entende-se assim, considerando que a lei fala em ação de indenização, existir um ato ilícito prévio à ação, do qual decorre o direito de reparação de danos.
Segundo José de Albuquerque Rocha, pouco importa a origem ou o título do direito sobre a coisa, bastando a verificação do ato ilícito:
“Derive o direito sobre a coisa do domínio ou propriedade, de outro direito real, dos direitos obrigacionais, ou da posse sem título, cabe a nomeação à autoria, desde que referido direito sobre a coisa seja violado por um ato ilícito e estejam presentes os seus demais requisitos. Daí aludir a lei ao “proprietário” ou ao “titular de um direito sobre a coisa”.
O prazo para o réu requerer a nomeação será o da defesa. Sendo deferido o pedido, o juiz suspenderá o curso do processo e determinará que o autor se manifeste no prazo de cinco dias (art. 64).
O autor poderá aceitar a nomeação, hipótese em que deverá promover a citação do nomeado. Todavia, se o autor recusar o nomeado, a nomeação ficará sem efeito (art. 65) e, por conseqüência, “assumirá os riscos da improcedência do pedido”, conforme aponta José Roberto dos Santos Bedaque.
Na hipótese de o nomeado reconhecer a qualidade que lhe foi atribuída, contra ele correrá o processo; porém, se a negar, o processo correrá contra o nomeante (art. 66).
Aceitando a nomeação, o nomeado passará à posição de réu e, por conseqüência, ser-lhe-á assinalado prazo para resposta. O nomeante, por seu turno, será excluído da demanda.
A mera recusa da nomeação pelo nomeado não o exime de eventual responsabilidade. Neste sentido, a sentença produzirá plenos efeitos contra ele, conforme entendimento de Celso Agrícola Barbi:
Como o nosso Código, modificando o anterior, não mais admite que a causa prossiga também contra o nomeado que recusou a nomeação, deve-se adotar a conclusão do Código português, no sentido de fazer a sentença ter força de coisa julgada também contra o nomeado. Deve-se, apenas, acrescentar que a eficácia da sentença contra ele inclui também a executividade, isto é, poderá ela ser executada contra nomeante e nomeado.
O principal objetivo de tal medida é evitar a falsa escusa do nomeado, pois a sentença sempre produzirá efeitos em relação a ele.
Quer seja a nomeação recusada pelo autor ou pelo próprio nomeado, ao nomeante será assinalado novo prazo, integral, para resposta (art. 67) se na primeira oportunidade houver apenas peticionado pela intervenção do nomeado.
Presumir-se-á aceita a nomeação nas hipóteses dos incisos I e II do art. 68 do CPC, ou seja, (i) se o autor nada requerer no prazo em que lhe competia manifestar-se acerca da nomeação ou (ii) se o nomeado não comparecer ou, comparecendo, nada alegar.
Tendo em vista que “a nomeação à autoria no sistema do Código não é uma faculdade, mas sim um dever do demandado”, conforme nos lembra Humberto Theodoro Júnior, a conseqüência do descumprimento deste ônus será a responsabilização por perdas e danos daquele que se omitir ou nomear pessoa diversa daquela em cujo nome detém a coisa demandada (art. 69, I e II).
A reparação dos prejuízos com fundamento no art. 69 não será pautada pelos ditames da responsabilidade objetiva, mas sim da subjetiva, conforme magistério de José de Albuquerque Rocha, ao afirmar que a hipótese “não se cuida (...) de responsabilidade objetiva do réu”. No mesmo sentido, Ovídio Araújo Baptista da Silva:
A responsabilidade do demandado, nas duas hipóteses previstas pelo art. 69, não prescinde da demonstração de sua culpa em não promover a nomeação à autoria, sendo de afastar, conforme acertadamente afirma Arruda Alvim, a aplicação à espécie do princípio da responsabilidade objetiva.
Manifesta-se em sentido contrário José Roberto dos Santos Bedaque, para quem “trata-se de responsabilidade objetiva, ou seja, que independe de culpa ou dolo”.
De qualquer modo, o futuro pedido de indenização deverá ser formulado em demanda autônoma que observará o procedimento cognitivo-condenatório.