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Resumo:
Trata-se de um estudo acerca da aplicação legal para os casos de crimes passionais, fazendo uma análise precisa do contexto histórico desse crime, mostrando como se deu a sua evolução durante o decorrer dos tempo.
Texto enviado ao JurisWay em 20/12/2010.
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Jane Matos Nascimento[1]
RESUMO
Trata-se de um estudo acerca da aplicação legal para os casos de crimes passionais, fazendo uma análise precisa do contexto histórico desse crime, mostrando como se deu a sua evolução durante o decorrer dos tempos, destacando ainda, as espécies de homicídio, tendo em vista que, o crime passional caracteriza-se como crimes contra a vida, com o objetivo demonstrar a verdadeira aplicação das penas nas espécies de homicídio.
PALAVRAS-CHAVE: Vida; homicídio; pena.
1 INTRODUÇÃO
A vida é o bem mais precioso que o ser humano possui. È o primeiro direito que lhes é consagrado, tratando-se assim, de um bem jurídico indisponível. A Carta Magna em seu art. 5° estabelece: "todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade". Nesse contexto, é de se dizer que, o Código Penal também protege “a vida”, aplicando as determinadas penas de homicídio aos casos de crime passional, tendo em vista que é um atentado contra a vida humana, tão quanto a sua liberdade, contra circunstancias alheias a vontade da vítima.
2 CONTEXTO HISTÓRICO
Os crimes passionais, sempre existiram desde os primórdios da antiguidade. Porém, não era muito conhecido.
Com a evolução social, e a ocorrência frequente de tal crime, houve a necessidade de se averiguar, passando então a serem denominados.
A princípio, compartilhando com os ensinamentos de José Geraldo da Silva:
Eis a razão para dizermos que o Direito penal é o ramo mais antigo do Direito, pois desde o alvorecer da humanidade, o homem vem reagindo contra qualquer forma de agressão. A reação penal já era encontrada nos clãs, pois o homem sempre possuiu um forte espírito de justiça (2007; p. 07).
Em análise às culturas matriarcais antigas, como a dos vickings pré-cristãos, verificou-se a inexistência do pensamento de crime passional. Existia o ato criminoso, porém, não havia uma tipificação legal. O que não quer dizer que, nesta época era inexistente o crime passional. Inobstante a isto, poderia até existir, mais como não tinham uma lei penal vigente no período, dava-se consequentemente, por inexistente uma punição para o agente que cometesse o crime em análise. Desse modo, matavam suas companheiras ou esposas por motivos que não imaginavam serem denominadores do chamado “emoção e paixão”.
A época do Império Romano Cristão, o crime em tela passou a ser mais conhecido, tendo em vista que, matar e vingar era algo cometido em nome da honra. Em razão disso, iniciou-se uma averiguação para se entender os motivos que levavam o indivíduo ao ato delituoso. Nesse contexto, aborda Danielly Ferlin:
Mais precisamente até a década de 70, o homicídio passional era velado como um direito concedido ao homem traído de recobrar ou lavar sua honra ferida. Nesta mesma época uma organização feminista intitulada SOS mulher desencadeou um trabalho de repressão e combate a este tipo criminal como slogan ‘Quem ama não mata’!,onde acima de tudo, visava garantir o direito da mulher à vida e a eficaz punibilidade dos criminosos (2008, p.1)
Na época da vingança divina, havia uma confusão por parte da sociedade entre crime e pecado. Desse modo, a punição seria mais alta, se maior fosse a ofensa ao Deus.
Faz-se mister enfatizar ainda, a ideia de domínio do homem sobre a mulher; não obstante, advinda do Império Romano e reconhecida pelo Brasil. Vale notar outrossim que, na maioria dos casos de crimes passionais ocorridos no País, são influenciados pela questão da desobediência da vítima, que não aceita ser dominada pelo agente, este que, tem em seu consciente a ideia de possuidor e chefe de todas as situações do relacionamento, obrigando que a companheira viva sob suas “ordens”, comportando-se nada mais, do que um súdito que deseja ver seus desejos realizados, caso contrário, imporá uma pena; pena tão drástica- ceifar uma vida por circunstancias alheias a vontade da vítima.
Ferlin acrescenta:
Por décadas a sociedade reiterou uma cultura machista onde validava a mulher como ser inferior, chegando-se ao extremo de considera-la propriedade do marido. Ainda hoje, este pensamento vige enraizado em conceitos arcaicos, mesmo que não tão sem reservas como outrora (2008, p. 1).
Denota-se que, o crime sempre existiu desde os tempos remotos, no entanto, com a evolução social foi denominando-se e sendo reconhecidos os chamados crimes passionais.
3 HOMICÍDIO E APLICAÇÃO DA PENA
O crime passional, não possui enquadramento legal próprio, apenas no caput do art. 28 do CP, apresenta-se a negativa de imputabilidade quando o agente é motivado pela “emoção e paixão”. Neste contexto, como o crime em análise, se enquadra no rol dos crimes contra a vida, será classificado em determinado homicídio.
O homicídio está intitulado na parte especial, no art. 121 do Código Penal[2], tendo assim, a “vida” como objeto jurídico a ser protegido.
Nesse feito, faz-se por conceituação de homicídio, a morte de um ser humano causado por outro. Impallomeni apud Capez acrescenta:
O homicídio tem a primazia entre os crimes mais graves, pois é o atentado contra a fonte mesma da ordem e segurança geral, sabendo-se que todos os bens públicos e privados, todas as instituições se fundam sobre o respeito à existência dos indivíduos que compõem o agregado social (p.3).
As espécies de homicídio valem dizer, homicídio simples (art. 121 caput CP); homicídio privilegiado (art. 121, § 1° CP[3]); homicídio qualificado (art. 121 § 2° CP[4]) e homicídio culposo (art. 121 § 3° CP[5]). A título ilustrativo vejamos.
Homicídio simples- constitui o tipo básico fundamental. Ele contém os componentes essenciais do crime[6]. È possível à tentativa, se o agente der início a prática e o resultado não ocorrer por circunstancias alheia a sua vontade.
A pena para o homicídio simples será de reclusão de seis a vinte anos.
Homicídio privilegiado- é quando o agente pratica o homicídio, deixando-se levar por motivos de reprovação a sua moral. No que toca a pena, esta pode variar de doze a trinta anos de reclusão. No entanto, o homicídio privilegiado possui causa de diminuição de pena, variável entre um sexto e um terço (§ 1°, art. 121), o que há divergência doutrinária, se a diminuição seria obrigatória ou facultativa ao Juiz.
Para Damásio E. de Jesus, a redução de pena seria obrigatória, pois trata de um direito consagrado ao réu. Assim afirma: “a diminuição da pena, presentes os seus requisitos, é obrigação do Juiz, não obstante o emprego pelo Código Penal da expressão ‘pode’ e o disposto no art. 492, § 1°, do Código de Processo Penal, que fala em ‘faculdade’. Reconhecido o privilégio pelos jurados, não fica ao arbítrio do Julgador diminuir ou não a pena”[7]. De outra face, são os ensinamentos de Magalhães de Noronha: “a oração do artigo, a nosso ver, não admite dúvidas: poder não é dever. Dissesse a lei, por exemplo, ‘o Juiz deve diminuir a pena’ ou ‘ a pena será diminuída’ etc., e a diminuição seria imperativa. Em face da redação do artigo, outra interpretação não nos parece possível”[8].
Posta assim a questão, é de se concordar com a primeira posição adotada, de modo que, se o privilégio for reconhecido pela banca de jurados do Tribunal do Júri, o réu tem esse direito, sendo ademais, obrigação do Juiz reconhecer e respeitar a soberania do veredicto, com lastro constitucional no art. 5°, XXXVIII[9].
Oportuno se faz estacar que, para que ocorra o privilégio, é imprescindível que, o homicídio seja posteriormente e de imediato a injusta provocação da vítima, caso oposto, não se considerará homicídio privilegiado.
A propósito, TJSP (RT, 622/268) apud Capez (2007):
O impulso emocional e o ato que dele resulta deve seguir-se imediatamente à provocação da vítima para configurar o homicídio privilegiado. O fato criminoso, objeto da minorante não poderá ser produto de cólera que se recalca, transformada em ódio, para uma vingança intempestiva (p. 38)
Homicídio qualificado- é aquele em que o agente, comete o crime tendo como impulso respectivos motivos, ou então, pratica o ato delitivo utilizando-se cruelmente de meios, impedindo e dificultando a defesa da vítima. Possui como pena, reclusão de doze a trinta anos de reclusão.
Como há de verificar-se, os motivos determinantes do fato, relacionados ao crime passional, caracterizam-se em:
a) Motivo torpe- motivo desprezível, insensível.
b) Motivo fútil- é o motivo insignificante. A título de exemplo: simples incidente de trânsito; rompimento de namoro; pequenas discussões entre familiares; o fato de a vítima ter rido do homicida; por que a vítima estava ‘olhando feio’[10].
Homicídio culposo- o tipo culposo, diferente do tipo doloso, ocorre quando o agente não tem a intenção de matar. O que não se aplica ao crime passional, de modo que, o agente sabe perfeitamente do ato a ser praticado.
A pena para este homicídio será de detenção de um a três anos.
Não se pode perder de vista, a questão do aumento de pena no homicídio culposo, da qual, trata o § 4° do art. 121 CP:
No homicídio culposo, a pena é aumentada de 1/3 (um terço), se o crime resulta de inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício, ou se o agente deixa de prestar imediato socorro á vítima, não procura diminuir as consequências do seu ato, ou foge para evitar prisão em flagrante. Sendo doloso o homicídio, a pena é aumentada de 1/3 (um terço) se o crime é praticado contra pessoa menor de 14 (quatorze) ou maior de 60 (sessenta) anos.
Homicídio doloso- advém de dolo, da intenção de matar. Está intitulado no art. 18 inciso I do Código penal[11]. Importante se torna mencionar que, não basta que o agente assuma seu erro; é preciso que o mesmo tenha consciência da ilicitude cometida.
O Código penal abrange qualificadoras à pena no caso de crime passional quando o crime é cometido por motivo fútil ou torpe. O motivo fútil é algo irrelevante, já o motivo torpe, é sinônimo de ódio, vingança.
O TJMS apud Ferlin ao julgar a apelação n. 2.546/97 entendeu que: “Caracteriza-se a qualificadora do motivo torpe quando o ciúme extravasa a normalidade a ponto de tornar repugnável à consciência média, por ser propulsionador de vingança ante a recusa da ex-mulher em reconciliar-se” (p.6).
Em contrapartida, o TJMT apud Ferlin entende ser o homicídio motivo fútil. Senão observa-se:
È fútil o motivo que leva companheiro a prática de homicídio contra sua amásia ao argumento de ciúmes e por entender estar sendo traído, deixando transparecer uma posição machista, hoje inaceitável por todas as correntes jurisprudenciais e doutrinárias do Direito Pátrio(p. 6).
Denota-se que, prevalece o entendimento jurisprudencial, no sentido do motivo torpe, passando assim, a inaplicabilidade do motivo fútil, vez que, o homem que mata sua esposa, companheira, namorada, ou qualquer uma que mantenha um relacionamento afetivo ou sexual, deu-se em virtude do ódio retido ou vingança, enquadrando-se, porém, como motivo torpe. Ferlin ressalta: “o sentimento que mortifica o passional é a perda, o desdouro, o inconformismo, destarte o desvirtua a um incomensurável desejo de vingança” (p. 6).
Na maioria dos casos passionais, o crime é enquadrado como doloso, tendo em vista que, o agente acometido por motivo torpe, em que há ausência de sensibilidade, intencionou a prática delitiva.
A ação penal é pública incondicionada, competindo, porém, ao Júri, o julgamento, por tratar-se de crime contra vida.
Vale ressaltar que, a pena poderá agravar-se em 1/3 (um terço) quando ficar demonstrada maior culpabilidade do autor do delito, em ter agido insensivelmente e covardemente, com vítimas maiores de 60 (sessenta anos) e o menor de 14 (quatorze) anos.
Imperioso se torna destacar ainda que, o crime passional não mais se intitula como homicídio privilegiado, que tem como causa a violenta emoção, entendimento este das jurisprudências recentes dos Tribunais, tão quanto, foi alterada a Lei dos Crimes Hediondos, Lei n.8072/90, após a morte da atriz Daniela Perez, passando o crime passional a ser considerado como crime hediondo.
A jurisprudência do TJSP apud Ferlin:
O homicídio privilegiado exige, para sua caracterização, três condições expressamente determinadas por lei: provocação injusta da vítima; emoção violenta do agente e reação logo em seguida à injusta provocação. A morte imposta a vítima, pelo acusado, tempo depois do rompimento justificado do namoro não se insere em tais disposições, para o reconhecimento do homicídio privilegiado (p. 5).
Em remate, frise-se que, o crime passional trata-se de crime contra vida, sendo enquadrado nas espécies de homicídio supramencionadas, fere ainda o princípio da dignidade da pessoa humana, intitulado no art. 5° da Constituição Federal, que assegura um mínimo de direito e igualdade que um ser pode ter.
4 CONCLUSÃO
Pelo exposto, vale dizer, o crime passional, mesmo não possuindo uma aplicação de pena própria, por se tratar de crimes contra a vida, em que o Código Penal, protege esse direito, será classificado nas espécies de homicídio, já vistas. Vale ressaltar que, o crime passional, deve ser enquadrado como crime doloso, tendo em vista que, o agente, motivado por futilidades, acaba com o direito de viver de sua amásia, no mais, possui discernimento perfeito do ato prestes a cometer. Denote-se que, o crime passional jamais deveria ser aceito como homicídio privilegiado, haja vista, a vítima pode até provocar o agente, lhe causando violenta emoção, mais nada justifica chacinar alguém, lhes tirando o primeiro direito que lhes é consagrado- o direito a vida- impossibilitando-a, contudo o direito de defesa. Ademais, o crime em análise, na maioria dos casos, é premeditado pelo agente, raramente ocorrido por impulso, pois geralmente, com o término do relacionamento é que se dá o ato delituoso, sendo que, para configuração do crime privilegiado os três componentes (provocação, emoção, reação) devem seguir imprescindivelmente uma sequência para que seja considerado como tal homicídio.
REFERÊNCIAS
AQUAVIVA, Marcus Cláudio. VadeMecum criminal. 2 ed. São Paulo. Ridel, 2009.
CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal, volume 2: parte especial. 7 ed. São Paulo. Saraiva, 2007.
FERLIN, Danielly. Dos crimes passionais: uma abordagem atual acerca dos componentes do homicídio por amor. Disponível em: <http://www.investidura.com.br/biblioteca-juridica/artigos/direito-penal/166269-dos-crimes-passionais-uma-abordagem-atual-acerca-dos-componentes-do-homicidio-por-amor.html>. Acesso em: 10 de out. 2010.
JESUS, Damásio E. de. Direito penal: parte especial: dos crimes contra a pessoa e dos crimes contra o patrimônio. V. 2. São Paulo. Saraiva. 2005.
SILVA, José Geraldo da. Teoria do Crime. 3ª Ed. Campinas-SP. Millennium, 2007.
PINTO, Antônio Luiz de Toledo; WINDT, Marcia Cristina Vaz dos santos; CÈSPEDES, Lívia. Vade Mecum. 7 ed. São Paulo. Saraiva, 2009.
[1] Bacharel em Direito pela Faculdade AGES (Faculdade de Ciências humanas e sociais).
[2]Art. 121 CP- Matar alguém:
Pena- reclusão de 6 (seis) a 20 (vinte) anos.
[3]§ 1°- Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o Juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço.
[4]§ 2°- Se o homicídio é cometido:
I- Mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe;
II- Por motivo fútil;
III- Com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum;
IV- À traição de emboscada, ou mediante dissimulação de outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido;
V- Para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime:
Pena: reclusão de 12 (dose) a 30 (trinta) anos.
[5]§ 3°- Se o homicídio é culposo:
Pena: detenção de 1 (um) a 3 (três) anos.
[6]CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. 7 ed. São Paulo. Saraiva, 2007. P. 28.
[7]Damásio E. de Jesus. Código Penal anotado, cit., p. 387.
[8]E. Magalhães de Noronha, Direito Penal, cit., v. 2, p. 25.
[9]Art. 5° CF- Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito a vida, a liberdade, a igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XXXVIII- é reconhecida a instituição do Júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados:
a) A plenitude de defesa;
b) O sigilo das votações;
c) A competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida.
[10]Nesse sentido os seguintes julgados na respectiva ordem de exemplos: RT, 533/324, 395/119,268/336; RF 207/344; STJ, 5ª turma, REsp 179.855, Rel. Min. Félix Fischer, DJU, 29-03-1999, p.206 (cf. Damásio E. de Jesus, Código Penal anotado, cit., p. 392).
[11]Art. 18- Diz-se o crime:
Crime doloso
I- Doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo.
Comentários e Opiniões
1) Alessandra (08/10/2011 às 23:11:15) parabéns pelo trabalho.obtive com sucesso a informação que precisava. | |
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