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Resumo:
A multa substitutiva, prevista no art. 44, § 2º, do Código Penal, com redação ditada pela Lei 9.714/98, não revogou o art. 60, § 2º, do mesmo Codex, impondo-se uma interpretaçao conciliatória, sistemática, dos referidos dispositivos.
Texto enviado ao JurisWay em 29/09/2010.
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Art. 44. As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando:
I – aplicada pena privativa de liberdade não superior a 4 (quatro) anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo;
II – o réu não for reincidente em crime doloso;
III – a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente.
§ 1º (Vetado)
§ 2º Na condenação igual ou inferior a 1 (um) ano, a substituição pode ser feita por multa ou por uma pena restritiva de direitos; se superior a 1 (um) ano, a pena privativa de liberdade pode ser substituída por uma pena restritiva de direitos e multa ou por duas restritivas de direitos.
§ 3º Se o condenado for reincidente, o juiz poderá aplicar a substituição, desde que, em face da condenação anterior, a medida seja socialmente recomendável e a reincidência não se tenha operado em virtude da prática do mesmo crime.
§ 4º A pena restritiva de direitos converte-se em privativa de liberdade quando ocorrer o descumprimento injustificado da restrição imposta. No cálculo da pena privativa de liberdade a executar será deduzido o tempo cumprido da pena restritiva de direitos, respeitado o saldo mínimo de 30 (trinta) dias de detenção ou reclusão.
§ 5º Sobrevindo condenação a pena privativa de liberdade, por outro crime, o juiz da execução penal decidirá sobre a conversão, podendo deixar de aplicá-la se for possível ao condenado cumprir a pena substitutiva anterior.
Art. 60. Na fixação da pena de multa o juiz deve atender, principalmente, à situação econômica do réu.
§ 1º A multa pode ser aumentada até o triplo, se o juiz considerar que, em virtude da situação econômica do réu, é ineficaz, embora aplicada no máximo.
§ 2º A pena privativa de liberdade aplicada, não superior a 6 (seis) meses, pode ser substituída pela de multa, observados os critérios dos incisos II e III do art. 44 deste Código.
Diante dos dispositivos acima transcritos, divergem os estudiosos sobre se permanece vigente ou teria sido revogado tacitamente o parágrafo segundo do art. 60 pelo parágrafo segundo do art. 44, ambos do Código Penal, tendo em vista a nova redação dada a este último dispositivo pela lei 9714/98.
É que enquanto o § 2º do art. 60, em sua primeira parte, revela a possibilidade de substituição pelo Juiz da pena privativa de liberdade aplicada na sentença em quantidade igual ou aquém a seis meses por uma pena de multa, exclusivamente, o art. 44 § 2º considera o dobro deste limite quantitativo para o mesmo efeito da substituição, porém, determina que esta se opere de forma alternativa, ou seja, por uma pena restritiva de direitos ou por uma multa, segundo a prudente e motivada escolha do julgador.
Luiz Flávio Gomes, ao lado de Sérgio Salomão Shecaria, dentre outros, adota o entendimento segundo o qual “está revogado o § 2º do art. 60 do Código Penal em razão da ampliação do “limite da multa substitutiva”
Adotamos posicionamento diverso. Sabe-se que um dos requisitos da substituição de pena privativa de liberdade por penas restritivas de direitos, como previsto no inciso I do art. 44 precitado, é não ser o crime praticado mediante violência ou grave ameaça à pessoa. Por outro lado, o § 2º do art. 60, cuidando da multa substitutiva, condiciona a sua aplicação ao preenchimento dos requisitos mencionados nos incisos II e III daquele artigo, tão somente.
De maneira que, assevera DELMANTO, há “coexistência do novo § 2º do art. 44 com o § 2º do art. 60. (DELMANTO, Celso, DELMANTO, Roberto, DELMANTO JUNIOR, Roberto, DELMANTO, Fabio Machado de Almeida. 5 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2000., p. 84/85)
Isto porque, não fazendo o § 2º do art. 60 expressa referência ao inciso I do art. 44, poder-se-ia afirmar, a princípio, que ao réu não reincidente em crime doloso que contasse com circunstâncias judiciais favoráveis, teria direito de ver substituída a pena privativa de liberdade que lhe foi aplicada em quantidade não superior a seis meses pela pena de multa, isoladamente, ainda que o crime que houvera praticado o fosse mediante violência ou grave ameaça à pessoa. Tal entendimento somente se verifica quando admitida a convivência dos dispositivos em exame. Do contrário, sustentando a revogação do art. 60, § 2º pelo art. 44, este último, numa interpretação simplesmente literal, impossiblitaria a substituição.
Mas, se é verdade que o requisito mencionado no inciso I do art. 44 adveio da consideração pelo legislador, como adverte CEZAR ROBERTO BITTENCOURT, in Código penal. Comentado. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 164, “não só do desvalor do resultado, mas, fundamentalmente, do desvalor da ação, que, nos crimes violentos, é, sem dúvida, muito maior, e, consequentemente, seu autor não deve merecer o benefício da substituição”, não é menos verdade, no entanto, como enfatiza magistralmente ALBERTO SILVA FRANCO, “...que não se pode emprestar ao dispositivo legal uma interpretação extremamente rígida, pois se corre o risco de provocar área de conflito”.
“Alguns crimes como os de constrangimento ilegal, lesão corporal dolosa simples e ameaça – destaca esse autor, citando em seguida lição de SHECARIA - ‘que pela pena em abstrato cominada podem ser alcançados pela solução consensual da Lei dos Juizados Especiais Criminais, estariam fora da incidência das penas alternativas, se houvesse o processo criminal.. Essa aparente iniquidade, caso seja feita uma interpretação literal, levaria a um absurdo: permitir o mais (aplicação das medidas alternativas da Lei 9.099/95, sem qualquer processo) e não o menos (medida assemelhada, após o processo)’” (FRANCO, Alberto Silva, STOCO, Rui. et. al. Código penal e sua interpretação jurisprudencial. Vol. 1. Parte Geral. 7 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001, p. 903)
Daí porque não cabe o argumento segundo o qual, pretendendo o art. 44 excluir os crimes praticados com violência ou grave ameaça da esfera da substituição, resulta, por conseqüência, que o art. 60, § 2º, posto que lei anterior e dispondo em sentido contrário, estaria revogado.
Na opinião do emérito Alberto Silva Franco “a possibilidade de composição entre o § 2º do art. 60 e o § 2º do art. 44, ambos do Código Penal, revela uma interpretação bem mais harmônica, menos onerosa para o condenado e mais concordante com os objetivos do legislador penal.” (ob. cit. p. 1121)
E como já vimos, DELMANTO, adotando esta linha de raciocínio desdobra a solução em duas hipóteses distintas, a saber: a) “não sendo a pena privativa de liberdade imposta superior a seis meses, aplica-se o § 2º do art. 60, pois a substituição por pena de multa nele prevista é mais benéfica do que a substituição por multa ou pena restritiva de direitos estipulada pela primeira parte do atual art. 44, § 2º. Isto porque, ao contrário do que ocorre com as penas restritivas de direitos (art. 44, § 4º), a pena de multa não mais pode ser convertida em pena privativa de liberdade – de acordo com o art. 51 do CP, acrescentamos – b) sendo a pena privativa de liberdade imposta superior a seis meses, mas igual ou inferior a um ano, aplica-se a primeira parte do novo art. 44, § 2 ...” (ob. cit. p. 84/85)
Abraçando os ensinamentos doutrinários acima expendidos, colocamo-nos a favor, portanto, da conjugação dos dispositivos transcritos para se chegar a melhor individualização da pena.
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