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Limitações ao Direito de Construir - A Defesa dos Direitos de Vizinhança


Autoria:

Luiz Henrique Franco Ribeiro


Advogado, graduado pela Faculdade de Direito do Sul de Minas - FDSM, sócio do escritório Franco Ribeiro Advocacia e Assessoria Jurídica, situado em Pouso Alegre, MG.

Texto enviado ao JurisWay em 10/06/2010.

Última edição/atualização em 13/06/2010.



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LUIZ HENRIQUE FRANCO RIBEIRO
 
 
 
 
 
LIMITAÇÕES AO DIREITO DE CONSTRUIR
A DEFESA DOS DIREITOS DE VIZINHANÇA
 
 
 
 
 
FACULDADE DE DIREITO DO SUL DE MINAS
POUSO ALEGRE
2009

LUIZ HENRIQUE FRANCO RIBEIRO
 
 
 
 

LIMITAÇÕES AO DIREITO DE CONSTRUIR
A DEFESA DOS DIREITOS DE VIZINHANÇA
 
 
 
 
Monografia Jurídica apresentada à Banca Examinadora da Faculdade de Direito do Sul de Minas como exigência parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito, sob a orientação do Professor Doutor Renato Maia.
 
 
 
 
 
 
 
FACULDADE DE DIREITO DO SUL DE MINAS
POUSO ALEGRE
2009

  
 
 

Banca Examinadora
 
 
 
                                                                 
 
 
                                                                 
  
                                                                 

 
 
 
 
 

À minha mãe, a verdadeira responsável por essa conquista.

AGRADECIMENTOS
 
 
 

Antes de tudo, a Deus, pois é o grande mestre da vida e fonte inexaurível de sabedoria, conhecimento e justiça.
 
Ao nobre professor Dr. Renato Maia, meu orientador e mestre, que soube como ninguém transmitir com clareza e absoluta propriedade os conhecimentos que nortearam o presente trabalho, além de ensinar com magnífico brilho a última etapa do Direito Civil em minha vida acadêmica.
 
Ao grande amigo e professor Dr. José Francisco de Oliveira, nobre defensor, com quem tive a honra e o prazer de aprender verdadeiramente a Ciência do Direito, não apenas na teoria, mas também na prática, com humanidade, respeito e presteza às pessoas humildes.
 
Aos meus professores, amigos, colegas e demais envolvidos neste trabalho, cujas amizades permanecerão para sempre, e em especial à Dra. Raquel Ribeiro Costa, ilustre defensora pública, que prontamente se ofereceu a prestar orientações acerca deste trabalho, com quem também muito aprendi durante meu estágio na Defensoria Pública.

RESUMO
 
 
 

Este trabalho é fruto de uma ampla pesquisa literária das obras de renomados autores do Direito Civil Brasileiro, oferecendo ao leitor um conhecimento claro e objetivo acerca dos problemas que se emergem do exercício do direito de construir sem a observância das restrições impostas pelo ordenamento jurídico ou pelos regulamentos administrativos. Estuda-se a propriedade, o direito de vizinhança, o direito de construir e as ações que a legislação processual coloca à disposição do ofendido para a proteção dos seus interesses.

SUMÁRIO
 
 
 

1
INTRODUÇÃO...............................................................................
7
2
DA PROPRIEDADE.......................................................................
9
2.1
Caracteres da propriedade...............................................................
10
2.2
Evolução do direito de propriedade.................................................
12
2.3
A função social da propriedade.......................................................
13
3
DO DIREITO DE VIZINHANÇA..................................................
16
3.1
Do uso anormal da propriedade.......................................................
18
3.2
Meios para a composição dos conflitos de vizinhança....................
23
3.3
Dos limites entre prédios e do direito de tapagem..........................
25
4
DO DIREITO DE CONSTRUIR....................................................
32
4.1
Limitações de ordem pública e de ordem privada...........................
33
4.2
Devassamento da propriedade vizinha............................................
34
4.3
Aberturas para luz e ventilação.......................................................
36
4.4
Desfazimento da obra......................................................................
37
4.5
As paredes divisórias.......................................................................
38
4.6
Preservação de poços e nascentes...................................................
40
4.7
O uso do imóvel vizinho.................................................................
41
4.8
A responsabilidade pelo dano causado............................................
42
5
REMÉDIOS PROCESSUAIS.........................................................
45
5.1
Ação demolitória.............................................................................
46
5.2
Ação de dano infecto ou caução de dano iminente.........................
47
5.3
Nunciação de obra nova..................................................................
49
5.4
Ação indenizatória...........................................................................
54
6
CONCLUSÃO.................................................................................
55
 
REFERÊNCIAS...............................................................................
56
 

1. INTRODUÇÃO
 
  
O presente trabalho é fruto de um estudo simplificado sobre o direito de construir e seus efeitos sobre o direito de vizinhança, que comumente atingem inúmeros proprietários e possuidores de imóveis nas áreas onde são edificadas construções sem a observação das limitações de ordem privada ou pública.
Objetiva ao final, após análise do conceito de propriedade e suas relações, visto que os direitos aqui tratados são inerentes àquela, oferecer ao leitor uma síntese das possibilidades para a defesa dos interesses do indivíduo enquanto vizinho, em face do exercício do direito de construir.
Inicialmente aborda-se de forma genérica o direito de propriedade, seus elementos, caracteres, evolução e a sua função social, defendida pela Carta Magna de 88.
No segundo momento analisa-se o direito de vizinhança, expondo de maneira clara a sua importância na relativização do direito de propriedade, avaliando o seu uso anormal, as atividades que poderão causar danos aos vizinhos e os meios para a solução de alguns problemas de vizinhança. Aborda-se ainda no direito de vizinhança, mas de maneira restringida ao direito de construir, os limites entre prédios e o direito de tapagem.
O direito de construir possui um capítulo à parte, porquanto é o objeto do presente trabalho, é também onde se analisa a prerrogativa ius fruendi, ou seja, o direito de usar ou gozar da coisa, donde decorre, dentre outros, o direito de edificar.
Examinam-se as limitações de ordem pública e de ordem privada que o proprietário deverá observar diante da pretensão de construir, assim como as proibições que visam proteger a privacidade do imóvel vizinho, as regras para a abertura de janelas e para a entrada de luz, as possibilidades de travejamento da parede contígua, as hipóteses em que o proprietário poderá usar o imóvel vizinho e a responsabilidade atribuída de forma objetiva àquele que causar danos em decorrência da construção.
Finalmente, num capítulo reservado sob o título “remédios processuais”, contemplar-se-á algumas das ações que visam proteger os direitos dos vizinhos em face do exercício irregular do direito de construir.
Explicam-se os cabimentos e hipóteses das ações de vizinhança mais utilizadas, como a ação demolitória, a ação de dano infecto, a nunciação de obra nova e a ação indenizatória.

2. A PROPRIEDADE

 
Trata o Código Civil de enunciar apenas os poderes e limitações do proprietário, não trazendo uma definição do que vem a ser propriedade, como se vê no caput do artigo 1.228, ao pronunciar que “O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha”.
De acordo com Carlos Roberto Gonçalves, os elementos usar, gozar dispor da coisa e reavê-la, conforme o caput do artigo acima, correspondem aos atributos jus utendi, fruendi, abutendi e à rei vindicatio, que advieram da propriedade romana, segundo ele, tais elementos constitutivos, quando reunidos estiverem e pertencendo a uma só pessoa, tem esta a titularidade plena de uma propriedade. Todavia, se um ou alguns destes elementos forem exercidos por outro, os poderes sobre a propriedade serão limitados, tal como ocorre com o usufruto, em que os direitos de usar e gozar da coisa ficam a cargo do usufrutuário, e ao nu proprietário cabe somente o direito de dispor e de reivindicar a coisa.
O direito de usar (jus utendi), primeiro elemento constitutivo da propriedade, faculta ao dono servir-se da coisa ou utilizá-la da maneira que lhe convier, não devendo, porém, alterar a sua substância, excluindo, se preferir, terceiros da mesma possibilidade.
Tal faculdade é limitada, porquanto o uso deve ser acerca dos limites da lei, e observar a função social da propriedade, de acordo com a prescrição do §1º do artigo 1.228 do Código Civil.
O proprietário, em virtude do jus utendi, tem a garantia de manter em seu poder a coisa, mesmo sem usá-la, apenas para servir-se dela quando bem lhe convier.
O jus fruendi (direito de gozar ou usufruir) permite a quem o detém, a percepção dos frutos naturais e civis da coisa, bem como o de tirar proveito economicamente do que ela produzir.
Pelo jus abutendi (direito de dispor) compreende-se a faculdade de transferir a coisa, gravá-la de ônus ou aliená-la a outrem, sob qualquer título, não implica, no entanto, a possibilidade de abusar da coisa, destruindo-a gratuitamente. Considera-se o mais importante dos direitos já mencionados, porquanto o ato de disposição da coisa revela a qualidade de dono.
Rei vindicatio ou direito de reaver a coisa, configura-se no poder de reivindicar das mãos de quem injustamente a possua ou detenha, revelando, outrossim, o direito de sequela, típico do direito real.[1]
 
 
2.1 - Caracteres da propriedade
 
 
O artigo 1.231 do Código Civil, ao se referir à propriedade, preceitua que “a propriedade presume-se plena e exclusiva, até prova em contrário”.
De acordo com Maria Helena Diniz, atribui-se ao direito de propriedade, em determinado sentido, o caráter absoluto, consagrado não apenas pela oponibilidade erga omnes, mas, por encontrar-se tal direito numa posição de superioridade entre os demais direitos reais[2], além disso, pelo fato de o seu titular possuir os atributos jus utendi, fruendi, abutendi e à rei vindicatio, como já visto anteriormente.
O caráter absoluto da propriedade, à luz do direito contemporâneo, retira-lhe, de certo modo, o extremo absolutismo, característica do direito romano, em virtude da lei, quando esta faculta ao interessado contestá-la, cabendo àquele que o faz, o ônus da prova.[3]
A exclusividade, outro caráter inerente à propriedade, alude a impossibilidade de a mesma coisa pertencer, simultaneamente, a duas ou mais pessoas. Importa lembrar, nesse sentindo, que o instituto do condomínio inclui a exclusividade, porquanto são os condôminos titulares do direito.[4]
A característica da perpetuidade ou irrevogabilidade da propriedade, como explica Carlos Roberto Gonçalves, significa que ela não se extingue pelo não-uso, ou, noutro caso, não restará perdida se não ocorrer alienação ou uma das formas de perda da propriedade previstas no ordenamento jurídico, tal característica é a que possibilita a sua transmissão post mortem.[5]
Alguns autores como Sílvio Venosa acrescentam à propriedade, a característica da elasticidade, entendendo assim pela faculdade de comprimir-se diante de restrições, como o usufruto, o uso e a habitação. Segundo sua lição, quando as restrições desaparecem, a propriedade volta a ser plena[6], caracterizando-se, pois, um efeito elástico.
Silvio Rodrigues salienta que o domínio, por recair sobre a coisa própria, distingue-se dos demais direitos reais, ao passo que os outros direitos elencados no artigo 1.225 do Código Civil, contemplam como objeto a coisa alheia. Constituem-se, portanto, excluindo-se a propriedade, direitos reais sobre coisas alheias.[7]
2.2 - A evolução do direito de propriedade
 
 
O homem, desde a antiguidade, buscou sempre a satisfação de suas necessidades vitais por meio da apropriação de bens. Antes, porém, os bens buscados eram os de consumo imediato, evoluindo no tempo, pretendendo o domínio de coisas móveis, até o surgimento da idéia de propriedade, que fora alcançada de forma progressiva. O anseio pela segurança se traduzia pela aquisição de bens.[8]
O direito romano compreendia a propriedade com o caráter individualista, nos tempos medievais passou a contemplá-la com dualidade de sujeitos, o proprietário e aquele que explorava a propriedade, pagando o segundo ao primeiro pelo seu uso. O domínio sobre a propriedade permanecia com determinada família, por meio de um sistema hereditário, visando a permanência desta no poder político.
É com o fim da Revolução Francesa que o caráter individualista da propriedade tornou-se mais acentuado, todavia, no século passado, com importante contribuição da Igreja Católica, o caráter social da propriedade pôde ser contemplado. As encíclicas Rerum Novarum e Quadragésimo Ano tornaram possível tal realização.[9]
Venosa, ao tratar dos aspectos históricos da propriedade, relata que no século XIX o extremo individualismo perde sua força, marcada tal época pela revolução e pelo desenvolvimento industrial, bem como pelo surgimento das doutrinas favoráveis à socialização da propriedade.[10]
A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, adotada e proclamada pela Resolução 217-A (III) pela Assembléia Geral das Nações Unidas, em 10 de dezembro de 1948, em seu artigo 17, quiçá na intenção de fortalecer o entendimento do seu caráter perpétuo, e permitir seu acesso a todos, sem distinção[11], desde lá, confere ao homem o direito à propriedade, refletindo-se tal princípio no ordenamento jurídico vigente, no entanto, a idéia de direito subjetivo absoluto, exercida pelo proprietário, lá compreendida, fora ainda mais amenizada, pois, como enxerga Silvio Rodrigues:
 
Os direitos subjetivos existem, mas não são absolutos. Têm um fim que os ultrapassa. São direitos-função. Devem ser exercidos não segundo os caprichos do proprietário, mas sob o plano da função a que correspondem. Se isso não ocorrer, seu exercício é abusivo.[12]
 
 
2.3 - A função social da propriedade
 
 
A Carta Magna de 88, em seu artigo 5º, XXII, garante o direito de propriedade, e no inciso XXIII do mesmo artigo, consagra a função social na propriedade ao pronunciar que “a propriedade atenderá a sua função social”, determinando, posteriormente, no artigo 170, III, que a ordem econômica observe a função social da propriedade, entre outros princípios.
Logo mais, em seu artigo 182, a dita Constituição trata da política urbana, e, especificamente no parágrafo 2º, informa quando a propriedade urbana cumprirá a sua função social.
O Código Civil, no parágrafo 1º do seu artigo 1.228, por sua vez, à função social da propriedade, assim se refere:
 
O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.
 
Ver-se-á mais adiante, no capítulo seguinte, ao ser abordado o direito de vizinhança, que quando descumprida a prescrição do artigo 1.228, comete o proprietário, ato ilícito quando não observa a função social da sua propriedade, nos moldes do artigo 187 do mesmo Código, in verbis:
 
Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.
 
Constitui-se abuso de direito a má utilização da propriedade ou o seu uso sem a observância da sua finalidade, trata-se, segundo Sílvio Venosa, de um exercício irregular de direito.[13]
Com a finalidade proposta pela Carta de 88, em seus artigos 182 e 183, objetivando regulamentar a política urbana, o Legislativo editou a Lei 10.257/01, denominada “Estatuto da Cidade”. Do seu artigo 1º entrevê-se a busca pela função social em nível municipal:
 
Art. 1o Na execução da política urbana, de que tratam os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, será aplicado o previsto nesta Lei.
Parágrafo único. Para todos os efeitos, esta Lei, denominada Estatuto da Cidade, estabelece normas de ordem pública e interesse social que regulam o uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental.
 
Como se percebe, a função social da propriedade, vislumbrada em traços desde a Declaração dos Direitos dos Homens e do Cidadão, contemplada em seguida pela Constituição Federal e regulamentada pela legislação ordinária, bem como pelo recente Estatuto da Cidade, tem sido a grande responsável pelo relativismo da propriedade, buscando, dessa forma, a limitação dos direitos do proprietário em favor da coletividade.

 

3. DO DIREITO DE VIZINHANÇA
 
A célebre expressão “nosso direito vai até onde começa o do nosso semelhante” não representa de maneira concisa o que se busca compreender no direito de vizinhança, porquanto este abrange mais, adentra um pouco os limites propostos pelo tradicional domínio absoluto, de modo a relativizá-lo em favor da propriedade alheia, buscando a paz entre os vizinhos, evitando prejuízos à segurança, ao sossego e à saúde daqueles, como preconiza o artigo 1.277 do Código Civil.
Silvio Rodrigues define os direitos de vizinhança como:
 
Limitações impostas pela lei às prerrogativas individuais e com o escopo de conciliar interesses de proprietários vizinhos, reduzindo os poderes inerentes ao domínio e de modo a regular a convivência.[14]
 
Importante é a distinção entre os direitos de vizinhança e a servidão, neste sentido, vislumbra-se que:
 
(...) a fonte do direito de vizinhança é a lei. Essa, aliás, constitui uma das distinções entre o direito de vizinhança e a servidão. Trata-se de institutos que apresentam aspectos semelhantes, pois em ambos surgem relações ligando dois prédios; todavia, em contrapartida, são nítidas as distinções entre um e outro. A primeira, é aquela já apontada.
Enquanto o direito de vizinhança decorre da lei, a servidão, em regra, deflui da vontade manifesta das partes e só excepcionalmente da usucapião.
Os direitos de vizinhança são uma limitação ao domínio, imposta pelo legislador com o fito de harmonizar o interesse dos vizinhos. Compõe-nos uma variedade de direitos e deveres recíprocos entre referidos vizinhos. A servidão é um direito real sobre a coisa alheia, estabelecido no interesse do proprietário do prédio dominante. Este desfruta de uma prerrogativa sobre o prédio serviente, sem que a recíproca seja verdadeira.[15]
 
Rodrigues enfatiza ainda que os direitos de vizinhança são obrigações propter rem, ou seja, basta a condição de vizinho para que o possuidor ou proprietário seja vinculado à obrigação de respeitar aqueles direitos, abstendo-se de certos atos ou sujeitando-se à invasão de seu domínio. Tal obrigação acompanha a coisa, transmitindo-se ao novo possuidor ou proprietário, extinguindo-se pelo abandono da coisa.[16]
A professora Maria Helena Diniz ensina que as restrições à propriedade emergem da necessidade de harmonizar o exercício dos proprietários confinantes sobre seus prédios. Admite que o simples fato da vizinhança, por si, já é o suficiente para gerar conflitos, e argumenta ainda que, além do exercício da propriedade, segundo sua função social, princípios como a boa-fé e a solidariedade entre os vizinhos deve prevalecer.[17]
Sobre restrições em favor do vizinho, a citada autora explica:
 
Dentro de sua zona o proprietário, ou o possuidor, pode, em regra, retirar da coisa que é sua todas as vantagens, conforme lhe for mais conveniente ou agradável, porém, a convivência social não permite que ele aja de tal forma que o exercício de seu direito passe a importar em grande sacrifício ou dano ao seu vizinho. P.ex.: o proprietário que acende sua lareira, mas a fumaça invade o prédio contíguo, trazendo sérios prejuízos aos seus moradores.[18]
 
  
3.1 DO USO ANORMAL DA PROPRIEDADE
 
 
O já aludido Código Civil de 2002, nos artigos 1.277 a 1.281, trata do uso anormal da propriedade, donde nasce para o ofendido, quando violado, o direito à proteção de seus interesses.
Assim dispõe o Novo Código Civil em seu artigo 1.277:
 
O proprietário ou o possuidor de um prédio tem o direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam, provocadas pela utilização de propriedade vizinha.
Parágrafo único: Proíbem-se as interferências considerando-se a natureza da utilização, a localização do prédio, atendidas as normas que distribuem as edificações em zonas, e os limites ordinários de tolerância dos moradores da vizinhança.
 
Interferências prejudiciais, na explicação de Gonçalves, que substituiu a vetusta locução do Código de 1916, “mau uso”, atos prejudiciais à segurança, sossego e à saúde, passíveis de causar desarmonia entre vizinhos, podem ser classificados em três espécies: atos ilegais, abusivos e lesivos.
Os atos ilegais, segundo ensina, são os ilícitos que obrigam à composição do dano, de acordo com a prescrição do art. 186 do Código Civil, analisado em consonância com o art. 927 do referido Código. São atos que, independente da existência do art. 1.277, acima transcrito, garantem ao vizinho ofendido, o direito à indenização.[19]
Prescreve o artigo 186 do Código Civil:
 
Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
 
Na seqüência, o artigo 187:
 
Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.
 
A responsabilidade civil, donde decorre a obrigação de indenizar, encontra seu fundamento no artigo 927 do já supracitado Código:
 
Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
 
Portanto, para que se configure um ato ilegal, basta que o vizinho ofensor, agindo por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, viole direito, causando dano a outrem, independentemente da existência da previsão do art. 1.277 do Código Civil de 2002.[20]
Constituem, por sua vez, atos abusivos, aqueles que, mesmo com o causador do incômodo se mantendo dentro dos limites de sua propriedade, prejudicam o vizinho, como, por exemplo, pelo barulho excessivo. Para ser considerado um ato abusivo, não há a necessidade de praticá-lo com o objetivo de prejudicar, mas também, quando o autor do ato o faz de maneira irregular, sem a observância da finalidade social.[21]
Atos lesivos são aqueles que causam danos ao vizinho, não pelo uso anormal da propriedade, mas, pela típica atividade exercida no local, como é o caso, por exemplo, da atividade industrial, que prejudica ou polui o ambiente, e, no entanto, tem seu funcionamento autorizado pelo Poder Público, por meio de Alvará.[22]
Informa Carlos Roberto Gonçalves que “Uso anormal é tanto o ilícito como o abusivo, em desacordo com a sua finalidade econômica ou social, a boa-fé ou os bons costumes”. Propõe ainda aquele autor, que para se checar a normalidade ou anormalidade da utilização de uma propriedade imóvel, deve-se procurar: a) verificar a extensão do dano ou do incômodo causado; b) examinar a zona onde ocorre o conflito, bem como os usos e costumes locais; c) considerar a anterioridade da posse.
A extensão do dano ou do incômodo causado: há de ser acima do limite do tolerável, sendo inferior, não há razão para ser reprimido. Alguns incômodos, quando não ultrapassam os limites razoáveis, devem ser suportados.
Examinar a zona onde ocorre o conflito, bem como os usos e costumes locais: Considerar-se-á o local onde ocorre o conflito, como também os usos e costumes do lugar, porque determinadas regiões, como as áreas industriais, não podem ser comparadas, sob o aspecto de tranqüilidade, com as áreas residenciais, tal como ocorre entre as metrópoles e as sossegadas cidades do interior.
Considerar a anterioridade da posse: segundo a teoria da pré-ocupação, que deve ser considerada de maneira relativa, observando-se os critérios legais permissivos, desassistido na sua razão estaria aquele que, evidentemente conhecendo, construísse nas proximidades de estabelecimentos que, por sua natureza, sejam barulhentos ou perigosos.[23]
Maria Helena Diniz, enfatizando o princípio do interesse público sobre o privado, da seguinte maneira aduz:
 
O proprietário lesado não terá direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, à saúde e ao sossego se elas forem justificadas por interesse público que prevalece sobre o particular (p. ex., abertura de poço artesiano ou construção de açude que acaba provocando umidade ou infiltrações em prédios vizinhos), caso em que o proprietário lesante pagará ao vizinho indenização cabal (CC, art. 1.278), que cubra integralmente os prejuízos sofridos. Se tais interferências tiverem que ser toleradas por decisão judicial, o vizinho poderá exigir, se possível, sua redução, ou eliminação, mediante realização de obras ou medidas de segurança (CC, art. 1.279). P. ex., se a emissão de gases poluentes de uma indústria for autorizada judicialmente, o vizinho lesado poderá pleitear sua redução propondo a instalação de filtros, ou se os ruídos por ela causados forem permitidos por decisão judicial, o prejudicado poderá exigir a colocação de forro especial para diminuir o barulho.[24]
 
O exercício do direito de propriedade, como assevera Venosa, não obstante sua amplitude, encontra limitações e restrições fundadas em interesses de ordem pública e privada, encontrando restrições até mesmo em face do interesse social, constitucionalmente assegurado, quando da existência de diversas propriedades imóveis em determinado espaço, que não precisam ser, necessariamente, imóveis contíguos.[25]
Para Carlos Roberto Gonçalves, o direito de propriedade, embora um dos mais amplos, não é absoluto, como expressa:
 
O direito de propriedade, malgrado seja o mais amplo dos direitos subjetivos concedidos ao homem no campo patrimonial, sofre inúmeras restrições ao seu exercício, impostas não só no interesse coletivo, senão também no interesse individual. Dentre as últimas destacam-se as determinadas pelas relações de vizinhança. [26]
 
Destarte é fácil perceber que os direitos de vizinhança constituem regras para um convívio pacífico entre aqueles que habitam imóveis próximos, outrossim, possibilitam, quando violado um direito, a busca pela sua reparação.
Importa expor que os danos possíveis em imóveis vizinhos são diversos, atingindo não apenas a propriedade imóvel enquanto coisa, mas, também a pessoa do possuidor ou proprietário, casos em que se possibilitará pleitear, além do dano material, o dano moral.
Segundo Venosa, o direito de ação contra o causador do dano compete aquele que é proprietário, possuidor, detentor ou usuário da coisa, uma vez que o seu direito não surge da qualidade de proprietário ou possuidor, mas, da condição de vizinho, da mesma forma, pode figurar como sujeito passivo qualquer daquelas pessoas, não importando ser ela proprietária ou possuidora, bastando apenas que seja, como o titular do direito ofendido, um vizinho.[27]
Os atos e fatos causadores dos incômodos, desconfortos e prejuízos autorizam o ingresso de dois tipos ações judiciais, que, conforme o caso poderá ser a ação indenizatória por perdas e danos, quando o prejuízo já ocorreu, ou, no caso de situação presente ou continuativa de prejuízo à segurança, sossego e saúde do vizinho ofendido, a ação de obrigação de fazer ou não fazer com cominação de multa diária, e o pedido indenizatório que poderá ser cumulativo, bem como o pedido da cessação da perturbação.[28]
 
 
 3.2 Meios para composição de conflitos de vizinhança
 
 
Como já mencionado anteriormente, o termo vizinhança não se limita apenas à contiguidade de prédios, mas, a toda extensão aonde o ato nocivo possa alcançar.
Diante da vastidão do ato, e da teórica ocorrência do dano, Carlos Roberto Gonçalves propõe algumas soluções, e assim as elenca:
 
a) Se o incômodo é normal, tolerável, não deve ser reprimido – A reclamação da vítima será aferida segundo o critério do homo medius. Só serão atendidas reclamações relativas a danos considerados insuportáveis ao homem normal.
 
b) Se o dano for intolerável, deve o juiz, primeiramente, determinar que seja reduzido a proporções normais – Pode o juiz, por exemplo, fixar horários de funcionamento da atividade considerada nociva (somente durante o dia, p. ex.), exigindo a colocação de aparelhos de controle da poluição, levantando barreiras de proteção etc.
 
c) Se não for possível reduzir o incômodo a níveis suportáveis, determinará o juiz a cessação da atividade – Quando nem mediante o emprego de medidas adequadas se conseguir reduzir o incômodo a níveis suportáveis, ou quando a ordem judicial para que sejam adotadas não for cumprida, determinará o juiz o fechamento da indústria ou do estabelecimento, a cessação da atividade ou até a demolição da obra, se forem de interesse particular
 
d) Não se determinará a cessação da atividade se a causadora do incômodo for indústria ou qualquer atividade de interesse social – Se o incômodo não puder ser reduzido aos graus de tolerabilidade mediante medidas adequadas, será imposto ao causador do dano a obrigação de indenizar o vizinho. Dispõe efetivamente o art. 1.278 do Código Civil que o direito atribuído ao prejudicado, de fazer cessar as interferências nocivas no art. 1.277, não prevalece quando forem justificadas por interesse público, caso em que o proprietário ou o possuidor, causador delas, pagará ao vizinho indenização cabal.[29]
 
Tanto o interesse privado, como o interesse público são dignos de proteção. No entanto, este, por representar o ânimo da coletividade, prevalece sobre aquele, mas, insurgindo-se o direito à indenização em favor do interesse particular, quando ofendido.[30]
 
 
3.3 Dos limites entre prédios e do direito de tapagem
 
 
Tratam os artigos 1.297 e 1.298 do Novo Código Civil da demarcação entre terrenos e do direito de tapagem. Nesse sentido, o primeiro artigo assim se expressa:
 
Art. 1.297. O proprietário tem direito a cercar, murar, valar ou tapar de qualquer modo o seu prédio, urbano ou rural, e pode constranger o seu confinante a proceder com ele à demarcação entre os dois prédios, a aviventar rumos apagados e a renovar marcos destruídos ou arruinados, repartindo-se proporcionalmente entre os interessados as respectivas despesas.
 
§ 1o Os intervalos, muros, cercas e os tapumes divisórios, tais como sebes vivas, cercas de arame ou de madeira, valas ou banquetas, presumem-se, até prova em contrário, pertencer a ambos os proprietários confinantes, sendo estes obrigados, de conformidade com os costumes da localidade, a concorrer, em partes iguais, para as despesas de sua construção e conservação.
 
§ 2o As sebes vivas, as árvores, ou plantas quaisquer, que servem de marco divisório, só podem ser cortadas, ou arrancadas, de comum acordo entre proprietários.
 
§ 3o A construção de tapumes especiais para impedir a passagem de animais de pequeno porte, ou para outro fim, pode ser exigida de quem provocou a necessidade deles, pelo proprietário, que não está obrigado a concorrer para as despesas.
 
Maria Helena Diniz, servindo-se das palavras doutros mestres, explica a quem é reservado o direito de demarcar:
 
O direito de demarcar é, segundo a lei, do proprietário que, em sentindo amplo, abrange todo aquele que é titular de um direito real: o enfiteuta, o usufrutuário, o usuário, o condômino (CPC, art. 952) e o nu proprietário. Não se estende, porém, ao possuidor direto (ao credor pignoratício, ao locatário, ao depositário), nem ao sucessor de herança ainda não partilhada.[31]
 
Como aponta Silvio Rodrigues, trata-se da ação finium regundorum, oriunda do direito romano.
Segundo Rodrigues, é imprescindível fixar-se os limites de cada terreno particular, evitando assim que ocorram invasões recíprocas, precavendo-se os proprietários de futuros conflitos de vizinhança.
Ademais, tomando-se em conta o interesse coletivo, a ação de demarcação é o meio de se delimitar a propriedade no espaço, individualizando-a, requisito essencial para que se proceda ao registro.[32]
Trata-se, de acordo com Venosa:
 
(...) de um direito potestativo do proprietário, imprescritível, exercitável, portanto, enquanto perdurar a confinância. É requisito para sua propositura que os limites entre os prédios de diferentes proprietários se apresentem com sinais exteriores duvidosos: muros, cercas, tapumes e valas desaparecidos ou destruídos, o que caracteriza os rumos apagados referidos pela lei. Não havendo ou não tendo havido obstáculo divisório, o proprietário vizinho é obrigado a aviventar ou renovar os marcos destruídos ou arruinados. Não importa a causa dessa ruína ou desaparecimento, por fato natural ou por ato humano. Se a destruição ou ruína ocorreu por culpa do vizinho, deverá responder pelos prejuízos correspondentes, deduzindo-se de outras despesas proporcionais referidas no dispositivo legal. Se perfeitamente delineada e presente a linha divisória entre os prédios, inviável será a ação.[33]
 
A posse, não raro, é levada em consideração para se proceder a demarcação, quando não se puder definir de maneira clara e precisa os limites da propriedade de um e de outro. Todavia, diante de tal circunstância, poderia ocorrer a dúvida sobre aquele que de fato exerce a posse, justa, como a lei prescreve. Nesse sentido, a cumulação de ação demarcatória com pretensão possessória poderá ser admitida.
Acentua Venosa, que, na ação demarcatória, quando houver a transferência probatória para o âmbito da posse, a análise do título dominial é mera contribuição. Ao contrário, se a referida ação for embasada exclusivamente em domínio, a tese possessória será irrelevante.
Interessante anotar que a natureza da ação demarcatória “é declaratória de propriedade preexistente”, sendo comum que traga em seu bojo, quando houver divergências sobre os confins entre prédios, pedido reivindicatório.[34]
Não se confunde, todavia, ação demarcatória com ações possessórias ou reivindicatórias. Naquela, o que se busca são os limites divisórios da propriedade, como diz o texto legal “aviventar rumos apagados e a renovar marcos destruídos ou arruinados”. Nas ações possessórias, o objetivo é a defesa propriamente dita da posse, independente de quem seja o proprietário, e nas ações reivindicatórias, tem-se por objetivo a busca pelo que se encontra, de forma injusta, nas mãos de outro.
Cumpre-se lembrar, do mesmo modo, que a ação divisória difere-se da demarcatória, porquanto a primeira é cabível nos casos em que a demarcação não é possível, sendo necessária que se promova a divisão do terreno, e, após, a sua demarcação.
Silvio Rodrigues indica os pressupostos necessários à procedência da ação demarcatória, a saber: “a) que haja necessidade de se fixarem os marcos divisórios; b) que os prédios sejam confinantes; c) que os prédios pertençam a donos diversos”.[35]
O artigo 1.298 do Código Civil indica os meios pelos quais se determinará a demarcação, e quando esta não for possível, propõe a divisão do terreno, e, em última instância, a adjudicação, in verbis:
 
Sendo confusos, os limites, em falta de outro meio, se determinarão de conformidade com a posse justa; e, não se achando ela provada, o terreno contestado se dividirá por partes iguais entre os prédios, ou, não sendo possível a divisão cômoda, se adjudicará a um deles, mediante indenização ao outro.
 
Esgotadas as tentativas propostas pela primeira parte do artigo 1.298, ou seja, quando não for possível ao juiz determinar os rumos, nem com os títulos dominiais, após o insucesso do exame da posse justa, proceder-se-á à divisão em partes iguais dos terrenos, cumprindo lembrar que a divisão se dará somente em relação à parte duvidosa, e não à integralidade dos prédios, como bem lembra o ilustre doutrinador.
Na hipótese seguinte, quando não for possível a “divisão cômoda” do terreno em litígio, ao magistrado caberá a adjudicação da área em discussão a um dos confinantes, devendo aquele que alcançar a propriedade da área, indenizar o outro. Todavia, interessa saber a quem caberá o prédio adjudicado, e neste caso, justo que se permaneça com aquele que ali já tiver edificado, portanto, devem ser levadas à análise as circunstâncias atuais de cada caso. Não se obsta, porém, que sejam cumuladas na mesma pretensão, a ação de divisão com a de demarcação.[36]
Maria Helena Diniz, de forma elucidativa, ensina que a ação demarcatória se divide em simples e qualificada. A primeira visa “a sinalização de limites, ou seja, fixar, restabelecer ou aviventar os marcos da linha divisória de dois prédios contíguos”. Pressupõe, por sua vez, que: a) os imóveis sejam contíguos; b) que haja a necessidade de se fixar limites novos ou aviventar os já existentes; e, por fim, c) que haja diversidade de domínio dos prédios vizinhos. Ressalta ainda que não sendo cumprido qualquer dos requisitos acima, a ação demarcatória não será cabível. A sentença homologatória nesta ação tem caráter simplesmente declaratório.
Na demarcatória qualificada, haverá cumulação de pedidos, ou seja, “a fixação de rumos e aviventação dos que já existem com o de restituição de glebas indevidamente ocupadas pelo dono do prédio confinante”.
Antes de mover a ação demarcatória, porém, faculta-se ao interessado recorrer diretamente aos interditos possessórios, bastando comprovar que uma parte do terreno de sua propriedade, injustamente, encontra-se sob o domínio do vizinho. [37]
 
Realmente, por exemplo, se o dono do prédio contíguo invade boa parte do imóvel do seu vizinho, ficando marcos, pode o lesado propor essa ação, cumulando seu pedido de fixar a linha divisória com a queixa de esbulho, turbação ou reivindicação (CPC, art. 951).[38]
 
Quanto aos efeitos da sentença na ação demarcatória qualificada, salienta a emérita professora, bem como outros renomados doutrinadores, que “faz coisa julgada em relação à propriedade quando a questão relativa a esta houver sido resolvida contenciosamente.”[39]
O Código Civil, em seu artigo 1.297, parágrafo primeiro, supra transcrito, informa que as divisas, não importando a sua natureza, até prova em contrário, pertencem a ambos os confinantes, portanto, sendo comum a estes o seu uso. As despesas oriundas da sua demarcação ou manutenção deverão ser rateadas entre os confinantes. O legislador ali se refere ao direito de tapagem.
 
Aos estudarmos o condomínio, vimos que o art. 1.328 confere direito ao proprietário limítrofe de adquirir a meação da parede, muro, vala, valado, ou cerca do vizinho, mediante o pagamento da metade do valor. A lei incentiva nesse aspecto o estabelecimento de comunhão no objeto da divisa. Ainda que o muro ou equivalente pertença exclusivamente a um dos proprietários (e isso será exceção, segundo a lei), tal não impede o outro confinante de usá-lo dentro de suas necessidades, sem ocasionar prejuízo ao vizinho. Tal regra decorre inelutavelmente do art. 1.297, § 1º, que cuida do direito de uso dos intervalos e muros ou outras divisórias pelos vizinhos e somente secundariamente cuida da presunção de propriedade comum da divisória.[40]
 
Maria Helena Diniz, acerca do artigo 1.297, esclarece que o tapume deve ser construído sobre a linha limítrofe entre as duas propriedades ou, preferindo doutra forma, poderão dividir a espessura do tapume em duas partes iguais, sendo construído de ambos os lados da linha divisória. Caso um proprietário construa apenas do seu lado, provando que o fez sozinho, não se fala em condomínio necessário sobre o tapume, porém, não conseguindo provar, prevalecerá a presunção de condomínio.[41]
Ao se falar em construção do tapume, prescreve o aludido artigo que se repartam as despesas entre os proprietários, para isso, mister haver prévio ajuste entre eles. Inexistindo tal consenso, o proprietário interessado, em juízo, deverá pleitear o reconhecimento da obrigação de contribuir para a construção do tapume. Ressalte-se, porém, que se o tapume for erigido sem as providências sugeridas, não poderá aquele que o fez reclamar do outro as despesas. Faculta-se, no entanto, por meio de procedimento judicial (CPC, art. 275, II, g), que o proprietário que não participou da construção, após reembolso da metade das despesas, adquira a meação do tapume.[42]
Interessante observar que dois são os tipos de tapumes, os divisórios, também chamados de comuns ou ordinários, e os especiais,previstos no §3º do artigo 1.297. Os primeiros visam a separação dos prédios, e são de responsabilidade de ambos os confinantes, obrigação que decorre da lei. Os segundos, chamados tapumes especiais, têm como objetivo a detenção dos animais domésticos e de pequeno porte, e sua construção e despesas, são de responsabilidade exclusiva do proprietário que provocou sua necessidade.
Pela não observância de tais preceitos, quando da ocorrência de dano provocado por animais em prédio contíguo, ficará o responsável sujeito a inúmeras sanções, tais como ao pagamento dos prejuízos causados por aqueles animais, nos termos do artigo 936 do Código Civil, bem como às penalidades previstas na legislação penal (CP, art. 164).
Necessária também é a observação relativa a uma suposta conduta dolosa por parte de um dos confinantes, quando este suprimir, deslocar ou desviar, em detrimento do outro proprietário, qualquer marco que indique a linha divisória entre os dois imóveis, pois configuraria crime previsto no artigo 161 do Código Penal.[43]
 
Acerca das faculdades conferidas ao proprietário como medidas de proteção à sua propriedade, complementa Maria Helena Diniz:
 
Não exorbita seu direito o proprietário que colocar ofendículas, por exemplo, cacos de vidro em cima do seu muro, grades de ferro terminadas em pontas de lança, cercas eletrificadas, com o intuito de ferir quem tentar ingressar em sua propriedade, pois isso tem por objetivo a defesa preventiva de seu domínio.[44]

 

4. DO DIREITO DE CONSTRUIR

 
No segundo capítulo do presente trabalho, de maneira sucinta, abordou-se a propriedade sob um contexto genérico, seu conceito, histórico, caracteres e atributos.
Enfatiza-se agora, dentre os atributos estudados, o jus fruendi, ou, na tradução jurídica de melhor compreensão, o direito de usar ou gozar da coisa, pois é dele que decorre o direito de construir, no entanto, como é sabido, e menciona Venosa, esse direito não é absoluto, porquanto se sujeita ao interesse público, em prol da comunidade e da vizinhança.[45]
O artigo 1.299 do Código Civil de 2002, na Seção VII, inaugura o direito de construir, com a seguinte expressão “O proprietário pode levantar em seu terreno as construções que lhe aprouver, salvo o direito dos vizinhos e os regulamentos administrativos”.
A regra é a liberdade de construir, e a exceção, as limitações. Entende-se, neste sentido, que a busca pelo fim social da propriedade prevalece. Assim esclarece Venosa:
 
O sentindo continua a ser sempre o da busca pela finalidade social da propriedade, o equacionamento do direito individual com o direito social. Deve ser entendido, no entanto, que a liberdade de construir é a regra. As limitações, como exceção, devem vir expostas pelo ordenamento. Essa utilização da propriedade deve, da mesma forma, sempre ser examinada em consonância com a regra geral de vizinhança do art. 554 ou art. 1.277 do atual Código, que reprimem o mau uso ou uso anormal da propriedade, quando ocasiona prejuízo à segurança, sossego e saúde da vizinhança. Aplicamos a esse respeito tudo o que foi exposto sobre o uso nocivo da propriedade.[46]
 
E conceitua construção:
 
Deve ser entendida como construção toda realização material sobre o imóvel decorrente de atividade humana. Desse modo, também são construção a edificação ou reforma, a demolição, o levantamento de muros, a escavação, o aterro, etc.[47]
 
 4.1 Limitações de ordem pública e de ordem privada
  
Carlos Roberto Gonçalves distingue as limitações de ordem pública, das limitações de ordem privada, nos seguintes termos:
 
As limitações de ordem pública são impostas pelos regulamentos administrativos e geralmente integram os códigos de posturas municipais. Têm em vista considerações de caráter urbanístico, como altura dos prédios e zoneamento das construções conforme a finalidade, impedindo a construção de edifícios de grande porte e de fábricas em bairros residenciais, bem como considerações relacionadas à segurança, higiene e estrutura dos prédios.
 
Já as limitações de direito privado constituem as restrições de vizinhança, consignadas em normas civis ou resultantes de convenções particulares. Assim, por exemplo, “não é lícito encostar à parede divisória chaminés, fogões, fornos” suscetíveis de produzir interferências prejudiciais ao vizinho (CC, 1.308), nem construir de maneira que o seu prédio “despeje águas, diretamente, sobre o prédio vizinho” (art. 1.300).[48]
 
Relativamente aos regulamentos administrativos, explica Maria Helena Diniz, que o proprietário que deseja construir deverá observar as normas administrativas:
 
a) que proíbem a construção de casa de taipa, palhoças e mocambos; de edifícios de elevados gabaritos; de fábricas ou estabelecimentos comerciais em zonas residenciais; de edificações nas proximidades de aeroportos e das fortificações; b) que impedem a demolição de prédios ou monumentos históricos; c) que exigem que as construções sejam de determinado tipo ou conservem certo recuo lateral ou do alinhamento da rua; d) que impõem o acatamento às regras de higiene, estética e solidez.[49]
 
O Estatuto da Cidade, autodenominação conferida à Lei 10.257/2001, regulamenta os artigos 182 e 183 da Carta Magna que estabelece as diretrizes gerais de política urbana. Tal Estatuto, por sua vez, atribui aos municípios a competência para criar suas normas urbanísticas e seu plano diretor, com preceitos a serem observados, os quais, entre outras normas, estabelecem direitos e limitações à construção.[50]
Caio Mário da Silva Pereira, referindo-se ao artigo 1.300, explica que o proprietário, ao edificar, deverá evitar que o beiral do telhado despeje águas sobre o prédio vizinho, precavendo-se aquele, através de calhas ou similares para os mesmos fins, ou, na impossibilidade do uso de tais meios, que deixe um espaço entre os prédios para essa finalidade.[51]
 
 4.2 Devassamento da propriedade vizinha
  
No artigo 1.301 do Código Civil, o legislador, com o propósito de preservar a privacidade no imóvel vizinho, estabeleceu uma importante proibição:
 
É defeso abrir janelas, ou fazer eirado, terraço ou varanda, a menos de metro e meio do terreno vizinho.
§1º As janelas cuja visão não incida sobre a linha divisória, bem como as perpendiculares, não poderão ser abertas a menos de setenta e cinco centímetros.
§2º As disposições deste artigo não abrangem as aberturas para luz ou ventilação, não maiores de dez centímetros de largura sobre vinte de comprimento e construídas a mais de dois metros de altura de cada piso.
 
Explica Sílvio Venosa que a limitação imposta pelo legislador no referido artigo 1.301 é negativa, tem por finalidade impedir a visão interna do prédio vizinho, resguardando, destarte, a sua privacidade. Observa, no entanto, que se houver entre as duas propriedades, rua, estrada ou caminho, as restrições do artigo mencionado não serão aplicadas. Lembra ainda que havendo interesse particular, como o do loteador ou empreendedor de um loteamento fechado, restrições mais abrangentes com esses objetivos poderão ser opostas, obtendo caráter obrigatório com o registro imobiliário.[52]
Com relação à distância aludida no caput do artigo 1.301, Gonçalves orienta que tal distância de metro e meio deve ser contada não do edifício vizinho, mas da linha divisória.[53]
Já no tocante ao parágrafo primeiro do artigo 1.301 do Código, Venosa, comparando com o Código de 1916, elucida:
 
No tocante às janelas ou varandas referidas na segunda parte do art. 573, a distância de metro e meio é do Código de 1916. O Código mais moderno refere-se a setenta e cinco centímetros. Essa distância deve ser contada da linha divisória do imóvel e não de outra janela. É distância mínima que a postura municipal ou a vontade privada pode aumentar. As janelas ou similares são proibidas nessa distância tanto se se situarem diretamente em frente do prédio vizinho, como obliquamente (...)[54]
 
Acrescenta Maria Helena Diniz que havendo um muro capaz de vedar a intimidade dos vizinhos, poderão ser abertas janelas com distância mínima de setenta e cinco centímetros, mesmo que diretamente voltada ao imóvel contíguo ou perpendicular a linha divisória, todavia ressalta que essa possibilidade não compreende terraço ou varanda.[55]
A Súmula 414 do Supremo Tribunal Federal, dando maior esclarecimento ao artigo 1.301, assim dispõe:
 
Não se distingue a visão direta da oblíqua, na proibição de abrir janela, fazer terraço, eirado ou varanda, a menos de metro e meio do prédio de outrem.[56]
 
 4.3 Aberturas para luz e ventilação
  
O § 2º do artigo 1.301 do Novo Código não proíbe as aberturas para a entrada de luz ou ventilação, mas estabelece que não pode ultrapassar dez centímetros de largura por vinte centímetros de comprimento, devendo ainda serem construídas acima de dois metros de cada piso.
De acordo com Maria Helena Diniz, se as aberturas para luz ou ventilação forem construídas em dimensões maiores que as previstas, serão compreendidas como janelas, e o proprietário vizinho poderá impugná-las, pois estarão violando a intimidade vizinha.[57]
 
 4.4 Desfazimento da obra
  
O artigo 1.302 faculta ao proprietário lesado exigir o desfazimento da obra que lhe causou prejuízo, desde que observado o prazo decadencial de ano e dia previsto no Código:
 
O proprietário pode, no lapso de ano e dia após a conclusão da obra, exigir que se desfaça janela, sacada, terraço ou goteira sobre o seu prédio; escoado o prazo, não poderá, por sua vez, edificar sem atender ao disposto no artigo antecedente, nem impedir, ou dificultar, o escoamento das águas da goteira, com prejuízo para o prédio vizinho.
Parágrafo único. Em se tratando de vãos, ou aberturas para luz, seja qual for a quantidade, altura e disposição, o vizinho poderá, a todo tempo, levantar a sua edificação, ou contramuro, ainda que lhes vede a claridade.
 
Venosa explica que o prazo de ano e dia conta-se a partir do término da obra, acrescentando que se a ação for proposta durante os trabalhos de construção, cabível será a nunciação de obra nova, se, porém, a obra já estiver concluída, caberá a ação demolitória. Ressalte-se que transcorrido o prazo de ano e dia, nasce para o construtor da janela ou similar, o direito de mantê-la, todavia, tal direito não se constitui como servidão, o que não impedirá o proprietário vizinho, que foi prejudicado pelo transcurso do prazo, de construir na divisa de seu terreno, mesmo vedando a claridade do imóvel já construído.[58]
 
4.5 As paredes divisórias
 
           No artigo 1.304, o Código permite ao proprietário do imóvel contíguo, observando determinadas circunstâncias, travejar a parede vizinha, ou seja, construir apoiando na parede confinante, tal dispositivo assim se expressa:
 
Nas cidades, vilas e povoados cuja edificação estiver adstrita a alinhamento, o dono de um terreno pode nele edificar, madeirando na parede divisória do prédio contíguo, se ela suportar a nova construção; mas terá de embolsar ao vizinho metade do valor da parede e do chão correspondentes.
 
A possibilidade acima somente se dará, segundo Venosa, nas cidades, vilas ou povoados em que a construção se submeta a alinhamento, além do mais, para tanto, a parede a ser travejada deverá suportar, e o proprietário que dela se utilizar, deverá fazê-lo somente até o meio de sua espessura devendo ainda embolsar o outro proprietário a metade do valor da parede e do chão utilizado.[59]
Maria Helena Dinizlembra que se o vizinho utilizar a parede do imóvel contíguo pagando metade desta ao outro proprietário, nos termos do artigo 1.304, tornar-se-á co-proprietário da parede e do solo, não se falando em servidão.[60]
O caput do artigo 1.305, por sua vez, compreende o vizinho que primeiro construir e explica a possibilidade de utilizar parte do terreno contíguo, bem como prevê a hipótese de caução, quando já houver uma parede divisória pertencente a um dos confrontantes:
 
O confinante que construir em primeiro lugar pode assentar a parede divisória até meia espessura no terreno vizinho sem que, por isso, perca o seu direito de haver meio valor dela, se o vizinho a travejar. Hipótese em que o primeiro fixará a largura e profundidade do alicerce. Se a parede divisória pertencer a um dos vizinhos e não tiver capacidade para ser travejada pelo outro, não poderá este fazer-lhe alicerce ao pé, sem que preste caução pelo risco a que a nova obra exponha a construção anterior.[61]
 
Inobstante a clareza do artigo 1.306, Caio Mário da Silva Pereira, facilita ainda mais a sua compreensão, orientando que o condomínio da parede-meia deverá ser exercido com certa cautela, devendo o vizinho condômino utilizá-la até meia espessura, avisando com antecedência o outro sobre as obras que pretende realizar, e, sobretudo, cuidando para que não haja riscos com a segurança e a separação dos prédios. Esclarece ainda que mesmo ante a existência de armários ou semelhantes no outro imóvel, o vizinho que depois construir não poderá o mesmo fazer, sem autorização expressa do outro confinante.[62]
O artigo 1.307 faculta ao vizinho elevar a parede divisória ou reconstruí-la, para suportar o alteamento, mas deverá o interessado suportar sozinho as despesas, bem como os gastos com a sua conservação. Todavia, se o outro proprietário confinante adquirir a meação da parede, dividirá com este as despesas, segundo as normas de condomínio de parede-meia, como já visto nos artigos anteriores.[63]
No próximo artigo, (art. 1.308, CC), o legislador adverte sobre a construção de chaminés, fogões, fornos ou quaisquer outras benfeitorias capazes de prejudicar o vizinho, quando encostadas à parede divisória.
A esse respeito, Caio Mário tece alguns comentários:
 
Não é lícito encostar na parede do vizinho, nem tampouco à parede-meia, fornos de forja ou de fundição, aparelhos higiênicos, fossas, canos de esgoto, depósitos de sal ou qualquer substância corrosiva ou capaz de causar dano, salvo consentimento expresso do interessado.
O dono de um prédio que se ache ameaçado pela construção de chaminé, fogão ou forno, não contíguo, ainda que seja comum a parede, tem o direito de embargar a obra ou exigir-lhe seja dada caução contra os possíveis prejuízos (caução de dano infecto). Mas nenhum procedimento é cabível se se tratar de fogão ou forno de cozinha ou de chaminés ordinárias (art. 1.308).[64]
 
 4.6 Preservação de poços e nascentes
  
Nos artigos 1.309 e 1.310, o Código contempla mais uma vez a água e preceitua algumas proibições referentes à poluição de nascentes em decorrência da construção, nesse sentido comenta Maria Helena Diniz:
 
São igualmente ilícitas as construções que poluírem ou inutilizarem, para uso ordinário, o uso de água de poço, ou nascente alheia, a elas preexistentes (CC, art. 1.309), bem como as escavações ou obras (canais, regos, sulcos etc.) que tirem ao poço ou à nascente de outrem a água indispensável às suas necessidades normais (CC, art. 1.310). Contudo, serão permitidas se apenas diminuírem o suprimento do poço ou da fonte do vizinho, e se forem mais profundas que as deste, em relação ao nível do lençol d’água (Cód. de Águas, arts. 96 a 98), desde que não cause prejuízo às pessoas que se servem do manancial.[65]
 
 4.7 O uso do imóvel vizinho
  
A Carta Magna de 88, em seu artigo 5º, inciso XI, estabelece que a casa é o asilo inviolável do indivíduo e que ninguém poderá adentrá-la senão após a permissão do morador, ou nos casos de flagrante delito, desastre, para prestar socorro ou por determinação judicial, neste caso, durante o dia.
Excepcionalmente, quiçá relativizando a norma constitucional, por questões de vizinhança em imóveis contíguos, o artigo 1.313 do Novo Código Civil autoriza a entrada de estranhos numa propriedade, mas expressa a condição de previamente avisar o proprietário sobre sua entrada, que deverá ser permitida somente sem duas situações: I) quando for necessária à reparação, construção, reconstrução ou limpeza de sua casa ou muro divisório; ou, II) para apoderar-se de suas coisas ou animais que lá se encontrem.
O parágrafo 1º do mesmo artigo amplia um pouco mais as hipóteses da entrada do vizinho na propriedade alheia, para os casos de limpeza ou reparação de esgotos, goteiras, aparelhos higiênicos, poços e nascentes ou para aparar cerca viva.
Segundo em seu parágrafo 2º, o direito de o vizinho permanecer naquele imóvel, depois de entregues seus pertences e animais, estará cessado, e sua permanência ali poderá ser impedida pelo morador ou proprietário.
Por fim, prescreve o parágrafo 3º que quaisquer danos causados pela entrada do vizinho no imóvel alheio deverão ser ressarcidos.
Sílvio Venosa explica sobre a obrigação de tolerar a entrada do vizinho:
 
(...) O proprietário ou possuidor é obrigado a tolerar essa visita a qual, no entanto, deve ser regulamentada entre as partes e provir de um aviso prévio como está na lei. A recusa injustificada dessa permissão de ingresso necessário pode acarretar o recurso ao Judiciário, que deverá assegurar prontamente o direito conforme as necessidades apontadas. Há situações de urgência que nem mesmo permitem o pedido de autorização e se aproximam ou constituem estado de necessidade. Assim, por exemplo, o rompimento de esgoto ou cano d’água, a iminência de incêndio ou ruína, entre tantas outras situações, podem exigir o ingresso imediato do vizinho ou de alguém por ele indicado para efetuar os reparos.(...)[66]
 
 4.8 A responsabilidade pelo dano causado
  
O Código Civil em seu artigo 1.311 proíbe quaisquer obras ou serviços capazes de causar deslocação de terra, desmoronamento ou prejudicar a segurança do imóvel contíguo, mas permite sejam feitas em casos necessários, condicionando sua execução à realização antecipada de obras acautelatórias. O parágrafo único dessa norma ressalta que em caso de dano, mesmo após a realização das obras acautelatórias, o proprietário deverá indenizar o vizinho pelos prejuízos causados.
Venosa esclarece que essa previsão relaciona-se com a ação de dano infecto, usada nas hipóteses em que a obra representa um risco à segurança do prédio adjacente ou quando passível de causar danos em determinada área.[67]
O artigo 1.312 do Código Civil comina a quem infringir as prescrições estabelecidas naquela Seção, obrigação de demolir a obra feita, além de responder por perdas e danos.
 
Maria Helena Diniz, acerca da responsabilidade decorrente do direito de construir, desta forma leciona:
 
O proprietário que erguer qualquer construção, com infringência dos regulamentos administrativos e dos direitos de vizinhança, estabelecidos do Código Civil, causando dano a alguém, terá inteira responsabilidade pelo fato, sendo obrigado a reparar o prejuízo.[68]
 
Sobre tal responsabilidade, bem explica o ilustre professor Silvio Rodrigues:
 
A responsabilidade, no caso, independe de prova de culpa, pois há que se entender que o dono do prédio prejudicado não pode sofrer dano pelo comportamento de seu vizinho, ainda que este atue sem culpa. A idéia é a de que os vizinhos estão ligados por uma obrigação legal de não se causarem, reciprocamente, quaisquer prejuízos. De modo que, se por acaso um deles, ao erguer em seu prédio determinada obra, provoca danos no prédio de seu vizinho, sua responsabilidade se caracteriza, mesmo que tenha tomado todas as cautelas para evitá-los, pois tal responsabilidade decorre da mera relação de causalidade entre a obra nova e o estrago verificado.[69]
 
Seguindo o sentido da doutrina dominante, Carlos Roberto Gonçalves também se mostra favorável ao defender que para se pleitear a indenização, necessário apenas que se prove o dano e o nexo causal entre este e a construção vizinha. “(...) independentemente de culpa de quem quer que seja, decorrendo exclusivamente da lesividade ou da nocividade da construção ou de seus atos preparatórios”.[70]
No tocante às obras de construção, comumente executadas pelas construtoras e engenheiros, Gonçalves atribui não somente ao proprietário a responsabilidade pelo dano causado, como também aos profissionais de engenharia e arquitetura, in verbis:
Desde que a construção civil passou a ser uma atividade legalmente regulamentada, e se tornou privativa de profissionais habilitados e de empresas autorizadas a executar trabalhos de engenharia e arquitetura, tornaram-se os construtores, os arquitetos ou a sociedade autorizada a construir responsáveis técnica e economicamente pelos danos da construção perante vizinhos, em solidariedade com o proprietário que encomenda a obra.[71]
 
Observa, porém, que se o proprietário suportar sozinho a indenização terá em seu favor ação regressiva contra o construtor, quando os danos houverem sido causados por imperícia ou negligência deste.[72]

5. REMÉDIOS PROCESSUAIS

 
Nos capítulos anteriores foram abordados o direito de vizinhança e o direito de construir, os sujeitos que podem figurar nos pólos ativo e passivo, bem como a natureza das ações cabíveis para a proteção do direito violado.
Todavia, a sua efetiva proteção, assegurada pelo direito material conforme faculta o Código Civil de 2002, sem os instrumentos adequados ao exercício do direito, não poderia ser exercida, destarte, compete à legislação processual informar os procedimentos cabíveis a cada caso, considerando de maneira relevante o tipo de dano sofrido e o tempo em que ocorreu.
Sílvio Venosa ensina que após a ocorrência do dano, quando não houver mais atos continuativos de perturbação, será cabível a ação indenizatória, devendo ser provado pelo autor da ação o que efetivamente perdeu, bem como o que deixou de ganhar, de maneira razoável. No entanto, se o ato perturbador persiste, a ação cabível será para obrigar o sujeito passivo da ação a fazer ou não fazer, com cominação de multa diária.[73]
Sob o aspecto processual, indica ainda o autor supracitado, que, havendo presença do fumus boni iuris e do periculum in mora, o magistrado concederá medida liminar, tendo em vista o seu poder de cautela, que se faculta às partes, por meio da legislação processual.[74]
 
A base do direito material para a ação está nos arts. 1.277 ss. Mais uma vez enfatizamos que não há execução sem título. A lesividade e o uso nocivo da propriedade são apurados no processo de conhecimento. O pedido na petição inicial é para a execução obedecer aos princípios da obrigação de fazer ou não fazer. Além da pretensão de multa diária, que é fator constritivo para a cessação do distúrbio, pode ser cumulado o pedido indenizatório. Quando não for possível obter coercitivamente a cessação do distúrbio, porque se atentaria com a própria liberdade individual, já que se impor um limite temporal na astreinte, resumindo-se também ela em um total final indenizatório. A multa diária tem natureza diversa da indenização. É ato constritivo. Há de ser tal monta que torne insuportável, inconveniente e intolerável ao réu a continuidade dos atos molestadores. Esse o sentido da imposição. Não se obsta, porém, ao juiz que reduza o valor exordialmente pedido. No entanto, não devemos olvidar que a finalidade da multa é constritiva e não indenizatória. Tanto assim que o pedido de multa diária pode ser cumulado com o de indenização.[75]
 
Por critérios lógicos atinentes ao presente trabalho, serão abordadas quatro ações mais comuns para a proteção dos interesses decorrentes do direito de vizinhança em face do direito de construir, são elas: a ação demolitória, ação de dano infecto, nunciação de obra nova e, finalmente, a ação indenizatória.
 
 5.1 Ação demolitória
 
A ação demolitória visa especificamente à demolição da construção que ameaçar ruína ou da construção que violar preceitos do direito de vizinhança. Sua previsão material está nos artigos 1.280 e 1.312 do Código Civil:
 
Art. 1.280: O proprietário ou o possuidor tem direito a exigir do dono do prédio vizinho a demolição, ou a reparação deste, quando ameace ruína, bem como que lhe preste caução pelo dano iminente.
 
Art. 1.312: Todo aquele que violar as proibições estabelecidas nesta Seção é obrigado a demolir as construções feitas, respondendo por perdas e danos.
 
 5.2 Ação de dano infecto ou caução de dano iminente
  
A ação de dano infecto visa proteger a segurança, sossego e saúde dos vizinhos que residem nas proximidades de determinado imóvel. Sua base material está contida no artigo 1.277 do Código Civil, que assim anuncia:
 
O proprietário ou o possuidor de um prédio tem o direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam, provocadas pela utilização de propriedade vizinha.
Parágrafo único: Proíbem-se as interferências considerando-se a natureza da utilização, a localização do prédio, atendidas as normas que distribuem as edificações em zonas e os limites ordinários de tolerância dos moradores da vizinhança.
 
Cabe ressaltar, entretanto, que essa ação tem caráter preventivo, por isso também é conhecida como caução de dano iminente, tal caução é autorizada pelo já aludido art. 1.280 do Código Civil e contemplada pelos arts. 826 a 838 do Código de Processo Civil. A caução de dano infecto poderá ser requerida como medida preparatória de posterior ação demolitória ou em procedimento autônomo, quando trabalhos perigosos forem executados em determinada propriedade, bem como quando o estado da construção oferecer riscos para a segurança, sossego e saúde dos vizinhos.
 
Araujo Júnior assim define essa ação:
 
A ação de dano infecto tem cabimento naquelas situações em que o proprietário ou possuidor de um imóvel esteja sofrendo, ou tenha justo receio de sofrer, dano ou prejuízo pelo uso nocivo (barulho excessivo, desordem, criação de animais, armazenagem de produtos perigosos, tais como explosivos e inflamáveis, exalações fétidas etc.) ou ruína, de prédio vizinho. Seu objetivo primordial é cominar pena ao proprietário do prédio vizinho, até que cesse a situação que fundamenta o pedido, ou a prestação de caução pelo dano iminente.[76]
 
Diante da situação, aquele que se sentir prejudicado, ou tiver justo receio de sê-lo, poderá ingressar com a ação de dano infecto para obter a sentença que reconheça uma obrigação (de fazer) do réu para eliminar o incômodo ou (de não fazer) para que o réu abstenha-se da prática de atos que causem o incômodo ou a situação de risco.
Como a ação de dano infecto não possui previsão na legislação processual, seguirá o procedimento comum ordinário ou sumário, conforme o valor da causa, tendo como pressuposto o art. 461 do CPC, que assim se expressa:
 
Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.
§ 1º - A obrigação somente se converterá em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado prático correspondente.
§ 2º - A indenização por perdas e danos dar-se-á sem prejuízo da multa (art. 287).
§ 3º - Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou mediante justificação prévia, citado o réu. A medida liminar poderá ser revogada ou modificada, a qualquer tempo, em decisão fundamentada.
§ 4º - O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior ou na sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando-lhe prazo razoável para o cumprimento do preceito.
§ 5º - Para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas necessárias, tais como a imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial.
§ 6º - O juiz poderá, de ofício, modificar o valor ou a periodicidade da multa, caso verifique que se tornou insuficiente ou excessiva.
 
Como se infere do texto legal, poderá ser imposta ao réu, de acordo com o § 4º do artigo acima transcrito, uma multa diária, conhecida como astreinte, que tem por objetivo obrigar o réu a cumprir a obrigação na forma específica, e não obrigá-lo a pagar tal multa, por isso deve o magistrado quando for arbitrar o seu valor, fixá-lo em valor considerável, para que o réu não veja como alternativa mais viável o pagamento da multa, mas o cumprimento da obrigação de fazer ou não fazer, conforme o pedido do autor.
A caução de dano infecto poderá ser requerida em quaisquer situações em que persistam a iminência ou permanência do dano pela execução de obra ou pelos atos praticados nos imóveis vizinhos, mesmo depois de ajuizada qualquer ação de vizinhança.
  
5.3 Nunciação de obra nova
  
Nunciação de obra nova é uma ação de natureza cominatória, expressa nos artigos 934 a 945 do Código de Processo Civil, e compete, segundo o artigo 934:
I - ao proprietário ou possuidor, a fim de impedir que a edificação de obra nova em imóvel vizinho lhe prejudique o prédio, suas servidões ou fins a que é destinado;
II - ao condômino, para impedir que o co-proprietário execute alguma obra com prejuízo ou alteração da coisa comum;
III - ao Município, a fim de impedir que o particular construa em contravenção da lei, do regulamento ou de postura.
 
Não obstante à clareza da lei sobre os aspectos contidos na legislação processual, Sílvio Venosa comenta sobre o uso e hipóteses dessa medida:
 
Cuida-se de ofensa à posse por obra vizinha. Essa ofensa depende do exame de posturas oficiais, de exigências impostas pelo loteador ou de simples regras de vizinhança. A edificação em curso deve prejudicar o prédio, suas servidões ou finalidades. Deve ser ajuizada no curso da obra. Trata-se de ação que visa a aspectos materiais. A obra em si. Se já terminada, não mais é cabível essa ação. Nesse caso, a ação para desfazer a coisa é a obrigação de fazer com preceito cominatório, pelo procedimento comum. A nunciação é também uma ação preventiva, perante ameaça de ofensa à posse. Cabe tanto ao possuidor direto, quanto ao indireto. Não se nega, portanto, legitimidade ao locatário que vê o imóvel locado ameaçado por obra próxima. A legitimidade pode ser concorrente tanto do dono do imóvel, como do locatário, nessa hipótese. [77]
 
Pontes de Miranda explica que a obra deve ter sido iniciada e não concluída, considerando-se iniciada quando comprovado o depósito de materiais de construção ou a abertura de fundações. Se apenas estiver na intenção do proprietário fazê-la, não deve ser considerada como iniciada, mas se o vizinho percebe, por exemplo, a chegada de caminhões de pedras, e o terreno não tem capacidade para suportar o peso, configura-se o risco. “O temor é o de pessoa razoável diante dos fatos que já existem”.[78]
De acordo com Professor Elpídio Donizetti, a ação de nunciação de obra nova não traz como pressuposto a posse, motivo pelo qual não consta no rol das ações possessórias, todavia, o uso dessa ação permite ao proprietário ou possuidor exercitar a defesa de sua posse, mas especificamente para impedir que a edificação em prédio vizinho cause danos ao imóvel de sua propriedade ou no qual esteja na posse.[79]
Luiz Rodrigues Wambier observa que o fundamento da ação de nunciação de obra nova é o direito de propriedade, orientando que o objetivo de tal ação é não permitir o abuso do direito de construir. Tem o proprietário ou possuidor, segundo este autor, por meio da ação de nunciação de obra nova, o direito de obstar a construção capaz de interferir de maneira anormal no imóvel de que detém a posse ou a propriedade. É meio de criar obstáculo ao andamento da obra nociva.[80]
Cabe dizer, de maneira a conceituar, que “obra nova” não significa simplesmente uma obra de construção, mas, além desta, qualquer alteração em imóvel, reforma, demolição, escavação, serviços de terraplanagem, pintura, podendo ser ainda colheitas, extração de minérios, corte de madeira, etc. A obra deve ter se iniciado e não ser concluída.[81]
Relativamente à legitimidade passiva, salienta-se que no pólo passivo estará sempre o dono da obra, não necessariamente o proprietário do terreno, porquanto há a possibilidade de edificação em terreno alheio, observa-se, porém, que o legitimado passivo deve ser o beneficiado pela obra.
Inobstante a possibilidade de concessão de liminar na ação de nunciação de obra nova, havendo urgência da medida, em determinados casos, o art. 935 do Estatuto Processual autoriza a antecipação da tutela antes mesmo de se propor a ação, que é alcançada por meio do embargo extrajudicial, promovido de forma verbal na presença de duas testemunhas, devendo este ser ratificado em juízo, através da petição inicial da ação de nunciação de obra nova, no prazo de três dias, para que adquira força de ato judicial, sob pena de ter seu efeito cessado.
Na falta do embargo extrajudicial, o autor poderá mesmo assim requerer a concessão de medida liminar através na mesma petição inicial com que se inicia a ação de nunciação de obra nova. Ressalte-se que o embargo extrajudicial será homologado imediatamente apenas se houver prova documental ou testemunhal, neste último caso, após a justificação com a presença das testemunhas presentes quando da notificação verbal feita pelo autor.[82]
De acordo com o art. 936 do CPC, o pedido principal na ação de nunciação (que é a suspensão da obra nociva e o desfazimento do que está prejudicando o autor), pode ser cumulado com o pedido de cominação de pena e condenação em perdas e danos.
A finalidade principal da ação é interromper a obra danosa, motivo pelo qual se faz necessário o pedido liminar. Sem este, a ação não seria um remédio preventivo, mas exclusivamente curativo, transformando-se em mera ação demolitória com respectiva condenação do réu por perdas e danos. A cominação de pena complementa o pedido de embargo liminar em caso de prosseguimento na obra embargada.
Para a propositura da ação é necessária a petição inicial com os requisitos do artigo 282 do CPC, independente de embargo extrajudicial, podendo ser cumulado com os pedidos de cominação de pena pecuniária e condenação em perdas e danos de acordo com o art. 936 do mesmo Código.
Os documentos que deverão acompanhar a exordial são: a) prova da propriedade, posse ou condomínio; e b) documentos probatórios do prejuízo (fotografias, plantas ou laudos extrajudiciais, etc.). Não havendo documentos para instruir a petição inicial, poderá o autor requerer a justificação prevista no art. 937 da carta processual.
Após a concessão da liminar ou a homologação do embargo extrajudicial, o oficial de justiça cumprirá a determinação do magistrado, lavrando auto circunstanciado no local da obra, descrevendo seu estado atual e intimando o construtor e os operários que ali se encontram para que não a prossigam sob pena de desobediência. A citação do dono da obra, na qual constará o prazo de cinco dias para a resposta que será feita em seguida, conforme reza o art. 938, e a ausência de contestação dentro do prazo imporão ao réu os efeitos da revelia, de acordo com o art. 803.
O parágrafo único do artigo 803 do Código de Processo Civil informa que se o réu apresentar contestação, observado o prazo legal, será designada audiência de instrução e julgamento.
O artigo 940 permite ao nunciado, todavia, requerer, em qualquer grau de jurisdição, o prosseguimento da obra, bastando que preste caução e demonstre o prejuízo da sua paralisação, que não poderá ser prejuízo pessoal, mas de danos que poderão ser causados à própria obra, se suspensa.
A caução referente à nunciação de obra nova é a mesma abordada na ação de dano infecto, poderá ser real ou fidejussória, de acordo com o parágrafo 1º do mencionado artigo, deverá ser prestada no juízo de origem da ação, mesmo que esteja em grau de recurso.
Não menos importante é a previsão do parágrafo 2º do artigo 940, que proíbe em quaisquer circunstâncias o prosseguimento da obra quando ela atentar contra regulamentos administrativos.
 
 5.4 Ação indenizatória
  
Com fundamento material no Código Civil de 2002, art. 1.299, e embasamento processual, no CPC, art. 275, II, alínea “c”, que dispõe sobre o rito sumário, a ação indenizatória é, quiçá, a mais freqüente entre as ações de vizinhança.
Dispõe o artigo 1.299 do CC que “O proprietário pode levantar em seu terreno as construções que lhe aprouver, salvo o direito dos vizinhos e os regulamentos administrativos.”
O CPC prevê a ação de indenização para ressarcimento por danos causados em prédio urbano e rústico, observando-se o procedimento sumário, independentemente do valor da causa.
Nada obsta, no entanto, que uma ação indenizatória para ressarcimento dos danos materiais ou morais, seja cumulada com outras ações abordadas nesse capítulo, como a ação demolitória, ação de dano infecto ou a ação de nunciação de obra nova.

6. CONCLUSÃO

 
O trabalho teve como pressuposto conhecer os problemas mais comuns ocasionados no âmbito do direito de vizinhança decorrentes do mau uso da propriedade pelo possuidor ou proprietário, sobretudo quando o indivíduo exerce na propriedade o seu direito de construir, objeto principal desta pesquisa.
Restou demonstrado através da pesquisa sobre o tema, que o direito de propriedade, inobstante a sua característica erga omnes, consagrada pelo Direito Romano, é relativo, não possui o proprietário direito total e pleno, exercido contra todos, sobre a sua propriedade, este é mitigado pelo direito de vizinhança, o que obriga o proprietário a observar normas do direito privado e regulamentos administrativos quando decide construir.
Elucidou-se igualmente, os meios de defesa dos direitos aqui tratados, expondo de maneira clara os tipos e cabimentos das ações de vizinhança, tendo em foco o direito de construir, que permitiu se constituir um manual sucinto sobre os remédios à disposição do ofendido para a proteção dos seus direitos, o qual não foi encontrado durante as pesquisas.
Conclui-se, finalmente, que o proprietário poderá edificar em sua propriedade como bem entender, mas não poderá, sob nenhum argumento, prejudicar o direito de outrem, retirando a sua paz, sossego ou afrontando a saúde dos que vivem nas proximidades da sua obra. Para tanto, deve observar fielmente a lei civil e os regulamentos administrativos, sob pena de ter a sua construção demolida ou ser obrigado a indenizar aquele que foi prejudicado.

 

 
  
ARAUJO JÚNIOR, Gediel Claudino de. Prática no processo civil. 11ª ed. São Paulo: Atlas, 2008
 
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: direito das coisas. 22ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007
 
DONIZETTI, Elpídio. Curso didático de direito processual civil. 9ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008
 
FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Direitos reais. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007
 
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: direito das coisas. 3ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008
 
MIRANDA, Pontes de. Tratado de direito privado: direito das coisas. Campinas: Bookseller, 2001. v.5
 
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil: direitos reais. 18ª. Rio de Janeiro: Forense, 2004
 
RODRIGUES, Silvio. Direito civil: direito das coisas. 27ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2002
 
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direitos reais. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2008
 
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direitos reais. 9ª ed. São Paulo: Atlas, 2009
 
WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil. 9ª ed. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2008. v.3


[1] Carlos Roberto Gonçalves. Direito civil brasileiro, p. 209.
[2] Maria Helena Diniz. Curso de direito civil brasileiro, p.115
[3] Maria Helena Diniz, Op. cit. p.116.
[4] Maria Helena Diniz, Loc. cit.
[5] Carlos Roberto Gonçalves, Op. cit. p. 222
[6] Sílvio de Salvo Venosa, Direito Civil, p. 171
[7] Silvio Rodrigues, Direito Civil, p. 77
[8] Ricardo Chaves Farias; Nelson Rosenvald. Direitos Reais, p. 171
[9] Carlos Roberto Gonçalves, Op. cit. p. 222
[10] Sílvio de Salvo Venosa, Op. cit. p. 159
[11] [http://www.mj.gov.br/sedh/ct/legis_intern/ddh_bib_inter_universal.htm]
[12] Silvio Rodrigues, Op. cit. p. 89
[13] Sílvio de Salvo Venosa, Op. cit. p. 171
[14] Silvio Rodrigues, Op. cit. p. 120
[15] Silvio Rodrigues, Op. cit. p. 120
[16] Silvio Rodrigues, Op. cit. p. 121
[17] Maria Helena Diniz, Op. cit. p. 264
[18] Maria Helena Diniz, Op. cit. p. 266
[19] Carlos Roberto Gonçalves, Op. cit. p. 327
[20] Carlos Roberto Gonçalves, Op. cit. p. 327
[21] Carlos Roberto Gonçalves, Loc. cit.
[22] Carlos Roberto Gonçalves, Op. cit. p. 328
[23] Carlos Roberto Gonçalves, Op. cit. p. 329
[24] Maria Helena Diniz, Op. cit. p. 270
[25] Sílvio de Salvo Venosa, Op. cit. p. 267
[26] Carlos Roberto Gonçalves, Op. cit. p. 325
[27] Sílvio de Salvo Venosa, Op. cit. p. 268
[28] Sílvio de Salvo Venosa, Loc. cit.
[29] Carlos Roberto Gonçalves, Op. cit. p. 331
[30] Carlos Roberto Gonçalves, Op. cit. p. 332
[31] Diniz, Maria Helena, Op. cit. p. 285
[32] Silvio Rodrigues, Op. cit. p. 153
[33] Sílvio de Salvo Venosa, Op. cit. p. 304
[34] Sílvio de Salvo Venosa, Loc. cit.
[35] Silvio Rodrigues, Op. cit. p. 154
[36] Sílvio de Salvo Venosa, Op. cit. p. 307
[37] Maria Helena Diniz, Op. cit. p. 286
[38] Maria Helena Diniz, Loc. cit.
[39] Maria Helena Diniz, Op. cit. p. 286
[40] Sílvio de Salvo Venosa, Op. cit. p. 309
[41] Maria Helena Diniz, Loc. cit.
[42] Maria Helena Diniz, Op. cit. p. 286
[43] Maria Helena Diniz, Op. cit. p. 289
[44] Maria Helena Diniz, Op. cit. p. 290
[45] Sílvio de Salvo Venosa, Op. cit. p. 309
[46] Sílvio de Salvo Venosa, Loc. cit.
[47] Sílvio de Salvo Venosa, Op. cit. p. 311
[48] Carlos Roberto Gonçalves, Op. cit. p. 347
[49] Maria Helena Diniz, Op. cit. p. 291
[50] Sílvio de Salvo Venosa, Op. cit. p. 310
[51] Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de Direito Civil, p. 224
[52] Sílvio de Salvo Venosa, Op. cit. p. 311
[53] Carlos Roberto Gonçalves, Op. cit. p. 350
[54] Sílvio de Salvo Venosa, Op. cit. p. 312
[55] Maria Helena Diniz, Op. cit. p. 296
[56] [http://www.dji.com.br/normas_inferiores/regimento_interno_e_sumula_stf/stf_0414.htm]
[57] Maria Helena Diniz, Op. cit. p. 297
[58] Sílvio de Salvo Venosa, Op. cit. p. 313
[59] Sílvio de Salvo Venosa, Op. cit. p. 315
[60] Maria Helena Diniz, Op. cit. p. 293
[61] Maria Helena Diniz, Op. cit. p. 293
[62] Caio Mário da Silva Pereira, Op. cit. p. 225
[63] Maria Helena Diniz, Op. cit. p. 294
[64] Caio Mário da Silva Pereira, Op. cit. p. 225
[65] Maria Helena Diniz, Op. cit. p. 295
[66] Sílvio de Salvo Venosa, Op. cit. p. 316
[67] Sílvio de Salvo Venosa, Op. cit. p. 317
[68] Maria Helena Diniz, Op. cit. p. 291
[69] Silvio Rodrigues, Op. cit. p. 163
[70] Carlos Roberto Gonçalves, Op. cit. p. 348
[71] Carlos Roberto Gonçalves, Op. cit. p. 349
[72] Carlos Roberto Gonçalves, Loc. cit.
[73] Sílvio de Salvo Venosa, Op. cit. p. 277
[74] Sílvio de Salvo Venosa, Loc. cit.
[75] Sílvio de Salvo Venosa, Op. cit. p. 277
[76] Gediel Claudino de Araujo Júnior, Prática no Processo Civil, p. 140
[77] Sílvio de Salvo Venosa, Op. cit. p. 152
[78] Pontes de Miranda, Tratado de Direito Privado, p. 470
[79] Elpídio Donizetti, Curso Didático de Processo Civil, p. 893
[80] Luiz Rodrigues Wambier, Curso Avançado de Processo Civil, p. 205
[81] Luiz Rodrigues Wambier, Loc. cit.
[82] Luiz Rodrigues Wambier, Op. cit. p. 207
 
REFERÊNCIAS
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